capítulo sétimo
— Você prefere doce de mamão ou um pedaço de goiabada?
Silêncio.
Dona Dalva, segurando a porta da dispensa, virou para trás e deu com a cara embasbacada do marido sentado à mesa, com o prato de comida quase intocado. Só então se lembrou: a bendita experiência, as duzentas palavras. Ainda pouco familiarizado com o vocabulário de duzentas palavras, seu Jonas não sabia o que responder. Ela suspirou, olhou para cima, ai minha santa Cecília, e simplificou, vencida:
— Você quer este?
— Não.
— Este, então?
— Sim.
Era o doce de mamão. O Major levantou a cabeça da soleira e abanou o rabo: para ele qualquer um servia. Dona Dalva serviu o marido, mas não conseguiu segurar a frustração:
— E eu vou ter que falar com meu marido que nem eu falo com o cachorro agora?
Seu Jonas tirou a caderneta do bolso, folheou rapidamente, balançando a cabeça como quem confirma algo e só então respondeu, telegráfico, com um sorriso infantil:
— Sim, Dalva. Falar. Menos. Agora.
Pobre dona Dalva. Sentiu as mãos tremerem, deixou cair o potinho de sobremesa, apoiou-se na pia. Quarenta anos de casamento e agora isso, a grama crescendo alta, a pintura do muro abandonada pela metade, um marido que não fala quase nada e pior: um marido sem fome. Aos olhos dela, era a ruína. Desmaiou.
Mais tarde, mais calma, ela passava o café enquanto seu Jonas cuidava da horta castigada pela chuvarada. Pelo menos para trabalhar ele não precisava falar nada, pelo menos agora ele largara aquele monte de papéis e a casa voltaria à ordem. Mas dona Dalva estava longe de se conformar.
Quando terminou, seu Jonas entrou pela porta da cozinha. Sentou-se em silêncio, cortou uma fatia de bolo, puxou a caneca para mais perto mas não encontrou o bule. Ohou para o fogão e não o viu lá também. Então pegou a caderneta, folheou, folheou e pareceu desolado.
— Ah, você esqueceu de colocar “café” na sua lista? Rá!
Foi quando ele viu que a coisa seria mais difícil do que pensara. Dona Dalva sentiu o mesmo e, com ares de vitória, deixou o marido sem café, só de birra. Se não fala, não ganha. E seguiu firme na novena.´
* * *
Pois é, um ano depois retomei a história (os capítulos anteriores estão aí em baixo) e agora só falta o último capítulo. Prometo não demorar um ano para terminar.
9 comentários:
obrigada por voltar!
ansiosa pelo último capítulo!
beijos.
Poxa, vai acabar durando um ano.... Você prometeu!!!
Preferia qndo demorava "só" um ano :(
Olá Bruno,
Conheci seu blog hoje e gostei muito da história Duzentas! Pena que não terminou...
Ache um tempinho, com certeza o final já está em sua cabeça! Grande abraço!
Aguardando o ultimo capitulo...
Encontrei o teu blog hoje e fiquei encantada!
Achei!
Olá, caro Bruno! Olha, eu não sei se você ainda visita o blog (já que ele está inativo há mais de 3 anos), porém eu PRECISAVA procurar e comentar aqui. EU LI O SEU LIVRO DE CONTOS, o "Essas Pequenas Ocasiões que Nos Fazem quem Somos" E ME APAIXONEI! ♡♡♡ Me senti muito representada! Tanto no seu modo de escrita quanto na sua história. Eu sou uma jovem de 17 anos que AMA escrever e meu sonho é publicar um livro algum dia, sem me importar com popularidade. Sis contos são tão simples, porém tão fofos e doces, até com lições de vida e só por curiosidade: você é cristão? Kkkkk. Enfim, de uma leitora sua, amei seu livro. Espero que me responda algum dia! ♡
Nessa corrente de leitores que esperam sua resposta venho me somar. O Acecipes figura nos meus favoritos há mais de 10 anos e hoje, numa Priscila que não é a Priscila que salvou esses favoritos anos atrás e num rompante da falta de fazer durante o trabalho, clicou e agradeceu por esses escritos ainda estarem aqui. Ainda mais agradecida pelo comentário do ano passado que indica que você publicou um livro e realizada por suas palavras ainda ecoarem por aí (pena que não por aqui).
Obrigada pelos escritos e espero que esteja bem!
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