29.3.11

Acepipes na universidade

"Estou trabalhando numa livraria, um sebo na verdade, e temos muito contato com alunos que procuram os livros dessas listas (e outras também). E eis que ontem uma cliente chega com a lista de livros da 3ª etapa do PAS, e quando olhei pro sétimo item da lista, lá estava o título do seu texto 'Zwkrshjistão'. Deu aquela sensação de 'eu conheço, que orgulho'. [...] Comentei com minha namorada, que também conhece seu blog, e ela teve a mesma reação que eu."

Novidade. E das boas.
     O Acepipes Escritos, mais especificamente o breve guia sobre o Zwkrshjstão –olwlhchkrasjia sz'ozsye!–, foi indicado como obra literária no Programa de Avaliação Seriada da Universidade de Brasília. Não sei direito como aconteceu.
     Pelo que me ensinaram, o PAS é uma iniciativa da UnB, que –me corrijam, por favor– visa a eliminar essa coisa terrível e meio injusta que é o vestibular e avaliar os candidatos durante o terceiro ano do Ensino Médio. Coisa legal.
     Enfim. O Acepipes está lá, tentando não se envergonhar muito na presença de Vinicius, Clarice, Drummond, Brecht, Nietzsche, Guimarães Rosa, Russel, Dias Gomes e Graciliano Ramos.
     É uma honra.
     Meu obrigado especial ao amigo professor J. Messias, responsável pela história toda. E um abraço ao Rodrigo, que me mandou a história bacana ali em cima.
     E, se a corrida atrás do sonho de estudar na UnB te trouxe aqui pela primeira vez: juro que não tive nada a ver com isso, por favor não me odeie. Desejo, isso sim, todo o sucesso nessa sua empreitada. Conte comigo.

* * *
ps. Sua Excelência o presidente Trçakydf envia cordiais saudações aos estimados estudantes brasileiros e aproveita o ensejo para relembrar que estão em aberto ainda nove vagas para intercâmbio no Instituto de Estudos Holísticos de Z'zträkosk. Para inscrever-se, basta preencher uma avaliação básica de fundamentos de dominó e ter noções de idioma zwkrshjistanês.

A um único leitor

Talvez você nem leia mais o meu blog, mas fica aqui caso um dia volte.
     Já faz uns dias que eu sei do que aconteceu. Também sei seu nome, esse que você assinou em baixo de uma crônica minha num concurso. E, embora você não me tenha feito o favor de arrumar aquele terceiro parágrafo –bem ruim–, vou lhe fazer um: a história fica sendo um segredo nosso.
     Admito que doeu um pouco porque é um texto querido meu, escrito num momento complicado há uns anos atrás. Por outro lado, penso que ele já cumpriu sua missão comigo –me libertou de algo que estava mal resolvido– e quem sabe agora tenha uma outra –meio torta, mas ainda assim uma missão– a cumprir no seu caminho.
     Pode continuar com ele. De onde tirei esse, posso tirar outros.
     Quem sabe um dia você note que não interessa o quanto as tenha achado bonitas, essa meia dúzia de frases nunca será sua. As palavras mais bonitas são sempre as que dizemos de nossos lábios. Você deve ter suas próprias, basta que procure.
     E se acontecer de a vida vir a te cobrar por essa atitude, peça a ela que me procure. Explicarei que já ficou tudo bem.
     Só espero, de coração, que um dia você entenda.

25.3.11

Dessas que acontecem o tempo todo

Sardas, sardas delicadas. Pele clarinha. Olhos claros, grandes, e cabelo escuro, pequeno. As alcinhas da blusa nos ombros frágeis. Uns gestos assim de quem quer parecer mulher feita, mas não adianta: tudo nela cheira a coisas frescas –e tem os sapatos, também: os sapatinhos denunciam um resto de meninice.
     Ao lado dela, o garoto não consegue disfarçar a tensão. Ela relaxada, jogada no banco, assoprando a última baforada do cigarro para o alto, mostrando o pescoço branquinho. Ele tenso, intimidado, sentado meio desconfortável na ponta do banco, esqueceu de tirar a mochila das costas, boca seca e mãos molhadas.
     Conversam. Ela conta como foi o dia, e ele saboreia cada palavra, imagina cada momento daqueles. Ela acordando de manhã, ela correndo para pegar o ônibus, ela escondendo-se da chuva, ela mostrando esmeraldas a um cliente na joalheria, ela almoçando um sanduíche natural, ela tomando um chá gelado desses com gosto de adoçante, ela saindo para fumar cinco minutinhos. Ela.
     Ela relaxada, ele tenso.
     Até que enfim ele tira a mochila das costas. Desajeitado. Agora pode se encostar no banco, vê-la sem ter que torcer o pescoço. O que ele não daria para que ela o visse como alguém além do amigo fofo.
     Ela puxa mais um cigarro do maço. Ele quer parecer que não liga, mas pediria a ela que parasse. O isqueiro de bolinhas vermelhas, o pescoço delicado, a boca assoprando para o céu.
     O que ele não daria.
     Chega então um sujeito. Um desses, que parecem mais do que são, que querem mais do que merecem. Dá no rosto da moça um beijo demorado e na mão do garoto um aperto apressado e mais se larga do que se senta no banco. Pede um cigarro a ela, solta a primeira baforada na direção dele.
     Alguém está sobrando no banco.
     A garota só tem olhos para o sujeito. O cigarro vai queimando: ela esqueceu de fumar. O garoto fica ali, quer parecer que não liga, mas pediria que ela não andasse com esses caras. O sujeito conta histórias, vantagens.
     O garoto interrompe, inventa uma qualquer. Alguém está sobrando no banco e ele decidiu quem é –não deveria ser. Levanta apressado, ajeita a mochila nas costas –parece mais pesada agora– e sai, com as mãos nos bolsos. Chuta uma pedra sem querer e mais adiante chuta de novo, por querer.
     O que ele não daria, meu Deus!
     A garota fica lá, procura o espelhinho na bolsa, agora é ela quem está tensa. O sujeito mal a olha, largado no banco, e conta suas histórias tortas: não sabe ouvir, só falar.
     Quem sabe um dia ela veja.

* * *
(Ou pelo menos foi o que eu imaginei, vendo a cena do outro lado da calçada, sentado no café.)

18.3.11

... e a nova rotina

Da minha casa nova, venho caminhando até o trabalho. São vinte e cinco minutos por ruas arborizadas, sabiás, uma praça, meia dúzia de vira-latas amistosos, uma velhinha regando margaridas e duas entradas de escolinha infantil.
     Hoje –só o intervalo entre um passo e o próximo–, vi o sol se levantando entre dois pinheiros no quintal de uma casinha de madeira. E acabo de me dar conta de que isso é tudo o que precisava escrever neste post.