19.7.10

Numa segunda-feira

Fazia semanas que o Amarildo estava querendo fazer isso. Meses, se bobear. Por isso, antes de apagar a luz para dormir, ele decidiu que amanhã finalmente seria o dia. Ponto.

* * *
Amanhã virou hoje e hoje, como decidido, era o dia.
     Como já sabia que enrolava na cama, o despertador tocava às cinco e quarenta, para levantar às seis. Ainda assim, seis acabava virando seis e pouco, seis e meia. Dava que que, quase sempre, o dia começava já atrasado. Mas hoje não.
     Porque hoje, hoje era o dia, e o Amarildo despertou assim que ouviu o celular –alguém ainda usa despertador?– chamar. Às cinco e quarenta da manhã começou com o plano: saiu de baixo das cobertas, espreguiçou esticou bocejou coçou os olhos. Fez até umas flexões. Em seguida, foi para a cozinha, onde começou a preparar um café da manhã caprichado.
     Como quase sempre ficava na cama mais do que devia, quase sempre só engolia o que desse tempo. Só que hoje, hoje era o dia, e Amarildo fez tudo como manda o figurino. Preparou o pão com queijo e ligou a sanduicheira, passou café, separou uma maçã, serviu um pouco de cereal na tigela, jogou mel e leite por cima. Sentou-se à mesa posta e comeu com calma, como deveria fazer sempre.
     Como quase sempre o tempo já estava estourando, ele ou deixava a barba por fazer, ou tomava um banho rápido daqueles como quando era moleque ou largava o cabelo de qualquer jeito. Só que hoje, hoje era o dia, então Amarildo foi ao banheiro, fez a barba, tomou banho, arrumou bem o cabelo.
     Quase sempre também só ia vestindo o que estivesse por cima da gaveta ou já estivesse desde a noite anterior largado em cima da cadeira. Só que hoje, o dia, Amarildo separou a roupa cuidadosamente. Cueca, meias, calça, camisa, blusa, jaqueta, cachecol. Escolheu peça por peça, fez até combinação. Colocou o crachá.
     O dia começou perfeito, como deveria ser. Porque hoje era o dia, e ele vinha planejando isso há semanas. Meses, se bobear.
     E então, café tomado, aparência cuidada, roupas vestidas, crachá no peito, Amarildo deitou na cama de novo, puxou as cobertas bem para cima, sentiu o cobertor ainda quentinho, deu um sorriso satisfeito e dormiu até depois do meio-dia. Hoje era o dia, e ele queria só ter o gostinho de voltar para a cama. Saber uma vez na vida qual era a sensação de voltar para a cama. De mandar tudo para o inferno e voltar para a cama numa segunda-feira.
     (Hoje era feriado, porque o Amarildo não era tão corajoso assim.)
     Foi o sono mais gostoso que ele já dormiu.

8 comentários:

Grasi disse...

Amei :)
Me coloquei no lugar dele... rsrs
Meus horários e minha rotina é bem parecida com a dele... e pensei se eu teria coragem de fazer o que ele fez (mesmo num feriado)... acho que não teria.
Muito legal.
Bjão e um ótimo começo de semana.

Magnum Opus disse...

Tá mais que certo o Amarildo! Só que quando é feriado deu 6 horas e eu já to acordado!!

Dani disse...

Oi Bruno! Tudo bem?

Eu nuca comentei aqui, acho que por timidez, mas já li e reli todos os textos do seu blog, que eu adoro! Sou fã mesmo!
E pra não variar, adorei esse texto também.
Pensei de tudo, que o Amarildo ia pedir alguém em casamento, que ele ia começar num emprego novo, menos que ele fosse voltar pra cama, hehe!
Muito bom!

Ana Luísa disse...

Hahaha, é realmente uma coisa boa! Eu deixo o despertador ligado, pra ter o gostinho de desligar e voltar a dormir. Mas levantar e fazer tudo pra depois voltar a dormir eu n faço de jeito nenhum hahaha.
Beijoss

Paulo Bono disse...

Ah, porra, faço isso direto.
Férias, feriado, o que for, acordo, dou uma geral e volto pra cama. Penso no trabalho, e foda-se.

abraço, Bruno

Lari Bohnenberger disse...

Ahahahahahahahahah!

ótimo! Nunca fiz isso, feriados eu prefira ficar na cama direto!
Mas que deve ser bom, ah, isso deve!

Bjs!

Cissa disse...

mas mesmo assim, voltar pra cama já é muito bom! XD

Leo Rodrigues disse...

Boa! Mas ele devia ter tirado a roupa, para ficar mais confortável.