Per me si va ne la città dolente,
per me si va ne l'etterno dolore,
per me si va tra la perduta gente.
Lasciate ogne speranza, voi ch'intrate!*
-Divina Commedia, D. Alighieri
I
Na noite de 6 de agosto de 1807, um corpo de mulher foi encontrado por um um bêbado no beco mais escuro da cidade. O terceiro assassinato em duas semanas.
Assim que o capelão lhe deu a notícia, o padre J., um velho e santo homem, uma alma piedosa e sensível, tomou alguma luz e entrou na igreja para rezar pela alma da pobre vítima. Empurrou a porta da sacristia com cuidado e deu a volta no altar-mor.
Quando ajoelhou-se, ouviu o bater cadenciado de um martelo. Acostumado a estar sozinho, o padre logo pensou nos ladrões que rondavam o ouro dos retábulos, mas, no momento seguinte, imaginou o que poderia ser. Então virou-se e deu com o escultor trabalhando em seus painéis. À volta do homem, todas as velas, exceto uma única, já haviam se consumido. Mas ele parecia não se dar conta da escuridão e esculpia com furor, como se tivesse algo urgente a terminar.
O padre, que puxava de uma perna, aproximou-se lentamente, os passos suaves ecoando no silêncio da igreja. Ergueu o candelabro para enxergar melhor, embora seus olhos cansados já enxergassem muito pouco: da placa de mármore haviam brotado várias almas que penavam pela expiação das suas culpas. Era o Purgatório.
O artista cinzelava agora uma figura nova, que o padre ainda não havia visto. Em primeiro plano, uma jovem parecia ignorar o sofrimento e olhava com esperança para longe, talvez o Paraíso pelo qual tanto ansiava. O padre J. espantou-se com a intensidade que ele conseguira imprimir na pedra fria.
Não querendo perturbar, e satisfeito com o que vira —a vista embaçada não o impedia de reconhecer um belo trabalho—, o padre voltou ao altar, rezou as completas, pediu piedade pela alma da moça e foi dormir.
O cinzel trabalhou durante quase toda a madrugada e, no dia seguinte, quando foi dizer as matinas, o padre J. deu com o belo painel terminado.
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* "Por mim se vai à cidade dolente, / por mim se vai à eterna dor, / por mim se vai à perdida gente. / Deixai toda esperança, ó vós que entrais!" Dante Alighieri, Divina comédia, canto III.
11 comentários:
Rapaz...
terminar um trabalho é sempre uma alegria.........
beijos e bons ventos nessa semana, querido
MM.
keep walking.
abraço
ô Maldade!!!! Deixou gosto de quero mais, pela narrativa parece ser uma bela história....
Tenho paixão pela Divina comédia de Dante e nem é por que meu nome é Beatriz... O purgatório é minha parte pradileta...
no meu blog só devo aparecer em setembro, mas por aqui vou dar uma passadinha sempre que possívl para ler a continuação da história.. beijos
Eba!!!
dessa vez só vou comentar o conto q ele for todo publicado
Beijos!
Seu blog é uma delícia!
Não dá vontade de sair.
Tudo por aqui é ótimo.
Parabéns!
Posso te linkar?
Beijuca
segunda parte, segunda parte...
Pensamento maldoso, esse de publicar em partes!!!
Demora não viu!!!
boa cara, tou gostando (me aconchegando na cadeira)
quero ver logo o desfecho desse conto, ou seria uma crônica??? bom bom, mas ja tenho um palpite... xD
ahh sim sim, na verdade estou terminando o meu curso ;)
fica na paz cara!
Muito bom, o texto e a passagem citada de A Divina Comédia.
Voltarei para ver o resto da estória, ou será história?
Beijos
Au Revoir
Uau
Quanta cultura alastrada nesta casa!!
Parabéns!!!
Cá estou voltando aos pouquinhos, com muita saudade!
Beijão
Mariliza
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