IV
(Partes anteriores: I, II e III)
"Querido" talvez não seja a palavra mais exata para dizer como o sr. D. era visto pelos vizinhos. Era mais como se todos estivessem acostumados à sua presença silenciosa depois de tantos anos ali. E foram os mais habituados que notaram primeiro as mudanças no seu comportamento.
Numa manhã, a senhora da barraca de frutas achou-o pálido, fragilizado, como quem carrega uma doença terrível e corrosiva dentro de si. E foi o porteiro do prédio quem primeiro notou, dali a alguns dias, as olheiras fundas de quem luta a noite inteira pelo sono que não vem. De fato, quem se encontrava com ele tinha a impressão de um homem cansado, oprimido por algum peso. Mas, como o sr. D. mantinha a mesma reserva de costume, ninguém encorajou-se a perguntar-lhe nada.
Não tardou a surgir o boato de que estivesse um pouco desequilibrado. Certa vez, ele vendia alguns volumes antigos para o livreiro quando, na rua, o vendedor de doces tocou seu sino chamando pelas crianças. Ao ouvir isso, por um instante, a expressão do sr. D. transformou-se numa careta de horror. Os olhos procuraram, rápidos, de onde vinha o som. Quando viu que se tratava apenas do doceiro e caiu em si, corou de vergonha, aceitou rápido o preço excessivamente baixo que o livreiro havia proposto de início e saiu às pressas, embaraçado.
Concluíram que talvez fosse insônia. Os vizinhos de baixo ouviam-no freqüentemente andando pelos cômodos durante a madrugada, numa ronda não se sabe à procura de quê. Os moradores do outro lado da rua confirmaram que havia uma luz sempre acesa no apartamento. Mas, além disso, quem cruzava com ele na rua pôde reparar que o sr. D. olhava para os lados, em movimentos furtivos, enquanto andava, como que procurando ou fugindo de alguém. Ao passo que, em duas semanas, a aparência exterior do sr. D. estava totalmente transformada.
Esta mudança não passou despercebida aos seus próprios olhos. Ele ouvia os boatos da vizinhança, mas sabia que nada tinha de louco. Ao contrário, continuava o mesmo homem sensato de sempre. O ponto é que era exatamente esta sensatez que lhe atormentava: ele resistia a todo tipo de pensamento sobrenatural, mas noite após noite crescia-lhe a dúvida de ser vigiado por dois olhos silenciosos na escuridão.
No apartamento do sr. D. reinava a mesma ordem e o mesmo silêncio de sempre, mas era como se ele se sentisse inconsolavelmente desprotegido.
(próximo capítulo)
18 comentários:
Cedi à pressões e publiquei antes da hora. Não sei se sou bonzinho ou bobo mesmo...
puxa, se curiosidade matasse... a gente não lia esses contos né?
quero maaaais!
:P
Nem bonzinho nem bobo, vc é um menino muito mau, isso sim. Fica se divertindo com a curiosidade alheia e agora que publicou mais cedo, significa que o próximo capítulo vai demorar ainda mais - ou logo a tarde tem mais????
Oi...
BRUNO eu juro que se você demorar pra postar a última parte do conto eu te mato!!!!
CARA, o que ta acontencendo com o Sr. D???
alias, que nome enigmático!!!
POSTA LOGOOOOOO
Isso nao se faz... Posta logo vai!!! Antes que eu morra de tanto roer as unhas...
Bjs meus
Acho que sei como o Sr. D. se sente. deve ser dificil para céticos como nós lidar com o sobrenatural....
muito bom conto, ainda anseio pelo final...
beijo
Rapaz, apareça no MSN para conversarmos, abraços tudo di bom.
Como eu sempre fui um pouco noveleira...estou acostumada a esperar.
Por mim...prossiga em seu ritmo.
Eliane
Mais mais mais...
to sozinha em casa, caramba !
e o sr. está demitido !!!
Querido amigo blogueiro
O endereço do meu blog mudou: Favor atualizá-lo. Só o nome mudou, mas eu continuo a mesma!rsrsrs
http://tempodesaturno.blogspot.com
Beijão e depois volto para te curtir mais
Mariliza
Que bem-feito, que bonito, que cheiro bom. Posso entrar?
Ah, em tempo, belíssimas fotos tb...
é bonzinho!
=D
beijos
tá ficando famoso hein moço! rsrs.
tb pudera, com esse dom para escrever!
Meudeusdocéu...tenho pena do Sr.D!
Muito só... com seus medos...
“ele resistia a todo tipo de pensamento sobrenatural,”
Já falei no outro comentário né? Que esse tipo de gente é sempre também o tipo de presa mais fácil... Ai, ai, ai...
Até breve, O Sino V
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