Admito: estou passando por uma crise de criatividade. Feia. Das bravas mesmo.
Mas nem tudo está perdido: postei hoje no Depósito de idéias. Quem sabe vocês não dêem uma passadinha por lá?
28.2.08
18.2.08
A prova
O professor já havia separado os alunos pela sala, carteira sim, carteira não. Ninguém via ninguém. Ninguém conversava com ninguém. Ninguém entrava, ninguém saía. Em seu estado de espírito normal, o Zequinha faria piada comparando a sala com a solitária do Bangu II. Mas o espírito do Zequinha não estava ali, tinha ficado em casa dormindo até mais tarde.
Ele olhou para o professor, que, sentado na sua mesa, lia um livro meio mofado a poucos centímetros da página, o nariz longe do papel só o suficiente para respirar. Os óculos grossos na certa não adiantavam muita coisa. O Zequinha arriscou:
— Professor?
Os óculos nem se mexeram do lugar para responder:
— Hum?
— Posso tirar uma dúvida?
— Só se for sobre alguma parte mal impressa.
O xerox estava horrível mesmo, uma parte já havia sumido depois de o Zequinha apagar umas cinco vezes com a borracha. Mas não era bem este o problema.
— É que eu não me lembro muito bem da fórmula...
— Faz parte do conteúdo. Não posso entregar a prova.
E então agitou o pulso para conferir o relógio, puxou o colarinho da camisa —fora de moda já há uns bons vinte anos— e voltou à leitura outra vez. Protestos da turma, "aahhs" generalizados: os outros alunos resolveram comprar a causa do Zequinha. Alguém chegou a aproveitar-se do anonimato e jogar uma bola de papel que, por sorte, não atingiu o alvo.
O professor largou o volume amarelado e mirou a turma com os olhos apertados: todos em silêncio, com a melhor cara de cachorro caído do caminhão de mudança. A Mi deu uma piscadinha. Então ele acabou cedendo, levantou-se da cadeira, puxou a calça mais para cima da cintura e foi até o quadro. Escreveu a fórmula a giz —uma briga de letras, números e vírgulas— e disse, como quem mostra uma banana ao macaco, a coisa mais natural do mundo:
— Pronto. Agora é só substituir.
Depois arrumou a franjinha engomada com gel —puxada de modo a esconder as entradas no cabelo— e afundou-se no livro de novo, dizendo sem levantar os olhos:
— Ah, sim, vocês têm mais dez minutos.
O problema era que o Zequinha não sabia substituir. Bom, agora fica para a prova de recuperação.
Ele olhou para o professor, que, sentado na sua mesa, lia um livro meio mofado a poucos centímetros da página, o nariz longe do papel só o suficiente para respirar. Os óculos grossos na certa não adiantavam muita coisa. O Zequinha arriscou:
— Professor?
Os óculos nem se mexeram do lugar para responder:
— Hum?
— Posso tirar uma dúvida?
— Só se for sobre alguma parte mal impressa.
O xerox estava horrível mesmo, uma parte já havia sumido depois de o Zequinha apagar umas cinco vezes com a borracha. Mas não era bem este o problema.
— É que eu não me lembro muito bem da fórmula...
— Faz parte do conteúdo. Não posso entregar a prova.
E então agitou o pulso para conferir o relógio, puxou o colarinho da camisa —fora de moda já há uns bons vinte anos— e voltou à leitura outra vez. Protestos da turma, "aahhs" generalizados: os outros alunos resolveram comprar a causa do Zequinha. Alguém chegou a aproveitar-se do anonimato e jogar uma bola de papel que, por sorte, não atingiu o alvo.
O professor largou o volume amarelado e mirou a turma com os olhos apertados: todos em silêncio, com a melhor cara de cachorro caído do caminhão de mudança. A Mi deu uma piscadinha. Então ele acabou cedendo, levantou-se da cadeira, puxou a calça mais para cima da cintura e foi até o quadro. Escreveu a fórmula a giz —uma briga de letras, números e vírgulas— e disse, como quem mostra uma banana ao macaco, a coisa mais natural do mundo:
— Pronto. Agora é só substituir.
Depois arrumou a franjinha engomada com gel —puxada de modo a esconder as entradas no cabelo— e afundou-se no livro de novo, dizendo sem levantar os olhos:
— Ah, sim, vocês têm mais dez minutos.
O problema era que o Zequinha não sabia substituir. Bom, agora fica para a prova de recuperação.
14.2.08
Pensamentos #3
Depois de muito tempo de resistência, me rendi ao óculos —se bem que não uso sempre, só quando quero, bem de vez em quando— e cheguei à conclusão que enxergar direito é um perigo. Agora passo na rua e vou vendo o pessoal à vontade dentro de casa, as garotas se trocando nos quartos, os casais se agarrando atrás das árvores... O mundo seria muito mais inocente se todo mundo fosse míope.
13.2.08
5.2.08
Soda e gelo
Outro dia fomos ao bar, o capitão Joe Náufrago e eu, para brindar nossa amizade, o que ele fez pedindo, claro, rum, muito rum. O garçom acabou trazendo nossas doses em dois copos altos cheios de gelo, misturando-as com duas latas de refrigerante e arrematando com canudinhos.
— Arrr!, pelos bigodes do Leviatã, seu fedelho sodomita! O diabo vai bater os dentes de frio no quinto dos infernos antes que o capitão Joe beba uma maldita porcaria imunda dessas!
— Mas, senhor, o que há de errad...
— Deixe eu lhe perguntar uma coisa, irmãozinho: está vendo este gancho? Acontece que eu sou um bastardo desastrado e às vezes ele acaba se enroscando nas tripas de algum sujeito e causando sofrimento a uma mãe. Mas você não quer que sua mãe sofra, quer, rapaz?
— Não, não, senhor. Mas...
— Pois então, pela felicidade de sua mãezinha, que Deus a conserve com saúde, nunca mais em toda sua vidinha imprestável ofenda um bom rum com esses lixos para maricas sodomitas de terra firme.
Acabamos degustando uma bela garrafa de rum de Barbados por cortesia da casa. O velho capitão tem, digamos, uma didática própria, mas sempre consegue fazer com que os mais jovens aprendam sobre as coisas da vida.
— Arrr!, pelos bigodes do Leviatã, seu fedelho sodomita! O diabo vai bater os dentes de frio no quinto dos infernos antes que o capitão Joe beba uma maldita porcaria imunda dessas!
— Mas, senhor, o que há de errad...
— Deixe eu lhe perguntar uma coisa, irmãozinho: está vendo este gancho? Acontece que eu sou um bastardo desastrado e às vezes ele acaba se enroscando nas tripas de algum sujeito e causando sofrimento a uma mãe. Mas você não quer que sua mãe sofra, quer, rapaz?
— Não, não, senhor. Mas...
— Pois então, pela felicidade de sua mãezinha, que Deus a conserve com saúde, nunca mais em toda sua vidinha imprestável ofenda um bom rum com esses lixos para maricas sodomitas de terra firme.
Acabamos degustando uma bela garrafa de rum de Barbados por cortesia da casa. O velho capitão tem, digamos, uma didática própria, mas sempre consegue fazer com que os mais jovens aprendam sobre as coisas da vida.
1.2.08
Assinar:
Postagens (Atom)