— Olha só, é um quadrado preto.
Seu Glicério é um homem direto. E ele não conseguiu disfarçar seu desdém pelos quadros que viu na exposição de arte moderna a que foi arrastado por Dona Eulália. Ela, professora aposentada, volta e meia vem com esses - como ela chamava - passeios culturais. Bota o vestido de listras para ficar mais magra, pega a bolsa e pronto, está decidido. E ele acha sempre a mesma chatice.
— Agora a gorda vai cantar a música do final. Vamos saindo antes que fique tudo tumultuado?
— Ih, o rapazinho ali usa malha... E olha a cara de nojo dele quando segura a bailarina!
— Impressão minha ou o cenário é o mesmo do ano passado, só que azul?
— Essa molecada tem mais é que ouvir o Adoniran para aprender o que é música.
Mas o pior de tudo é a arte moderna. Seu Glicério tem um livro encadernado em capa dura dos renascentistas, que ele juntou nos fascículos do jornal, e aquilo para ele é arte, que os quadros parecem até umas fotos. De atual, ele gosta mesmo dos quadros do amigo Rui, antigo colega de repartição. Na verdade, o Rui comprou uma caixa de tintas depois que se aposentou e pinta a mesma paisagem há doze anos. Varia só a estação do ano e a cor do vestido da camponesa.
— Que Rui o quê, Glicério! Olha isso que beleza.
— Ah, se eu empilhar seus vasos de planta e colocar minha furadeira em cima fica igual.
Dona Eulália até que gosta dos quadros, mas, no fundo, no fundo, não troca sua Santa Ceia com moldura dourada italiana por nenhum deles. Ela gosta é de passear culturalmente, para arejar um pouco e se sentir antenada.
— No meu tempo, artista era quem sabia desenhar. Isso aí é um quadrado preto.
Dona Eulália belisca, manda falar baixo, mas não tem jeito, um dia morre de vergonha. Seu Glicério se declara um herói, afirma que todo mundo pensa isso, até essas madames empertigadas, mas ninguém tem coragem de dizer. Ficam colocando angústia existencial e crítica social onde só tem um quadrado preto. E mal desenhado ainda, que o sujeito não usou nem uma régua.
26.2.07
22.2.07
Alto Tarumã
Houve uma época, numa das várias casas da minha vida, em que ônibus era complicado. Tinha só um —o Alto Tarumã—, e de meia em meia hora. À noite, quando voltava para casa, era pior: só de hora em hora. Saía do centro da cidade sempre no minuto 35 —20h35, 21h35, 22h35 e 23h35.
Eu tinha de correr para pegar o das oito e trinta e cinco. Se perdesse, tinha de fazer hora em algum lugar e ir para a fila às nove e meia. Foi isso que aconteceu certa noite. E foi nessa noite que eu a vi.
Era uma moça delicada, de pele branca —e, imagino, macia—, cabelo cortado curtinho, preto. Usava roupas de bom gosto, discretas, femininas —saia, ai, essa minha queda por mulher de saia—, e um perfume suave de que me lembro até hoje. Carregava sempre umas bolsinhas pequenas, coloridas, o que denunciava um ar de menina. Braços finos, mãos delicadas, unhas pintadas de esmalte clarinho. Uma vez pude ver a tatuagem de cereja no ombro direito. Atrevi-me a olhar para seus olhos poucas vezes, e eram cinzentos, brilhantes, lindos. Linda.
Acabei descobrindo com o tempo que ela voltava para casa sempre no mesmo ônibus: o Alto Tarumã das nove e trinta e cinco. Passei, então, a, de propósito, perder todas as noites o ônibus das oito. Algumas vezes, quando eu chegava, ela já estava lá. Outras, eu não a via na fila, mas logo ela entrava num lugar lá atrás.
Numa noite sem nada de especial, cheguei na praça e vi que ela era a última da fila. Parei bem atrás dela e senti seu perfume. Então ela virou-se e perguntou, com um sorriso simpático, "tudo bem?". Respondi, surpreso. A voz era como tudo nela: delicada, doce.
Ficamos conhecidos. E a mim bastava somente isso. Não tínhamos relação nenhuma além dos cumprimentos de toda noite. Talvez, bobeira minha, uma amizade ou até um romance não tivessem me contentado tanto quanto esses simples "boa noite". Jamais cheguei a prolongar a conversa além de comentar, uma ou duas vezes, sobre o ônibus atrasado. Não sei explicar. Não queria parecer vulgar, nem demonstrar que a achava assim. Ou talvez ela fosse para mim meio inalcançável, quase irreal. Pura. Não sei.
Também não sei dizer se cheguei a me apaixonar. Sei que me atraíam sua beleza feminina e seus modos delicados, como se, depois de um dia de estudo e trabalho, encontrá-la na fila fosse um descanso. Minha recompensa por ter sido um bom menino. E, embora minha história pareça longa, foram poucas as noites em que a vi.
Numa terça-feira cheguei em casa e minha mãe me avisou da mudança. Casa de aluguel, sabe como é. O dono já pedira há algumas semanas e meu pai finalmente conseguira uma nova. Iríamos mudar já no fim de semana. Ótimo, sempre gostei de mudança, mas logo notei que teria de pegar outro ônibus para estudar e trabalhar e nunca mais veria a moça do cabelo curto.
A semana passou e eu a encontrei na fila como sempre. Não sabia o que fazer. Não sabia nem mesmo se devia fazer algo.
Na sexta-feira, o último dia em que eu tomava o Alto Tarumã das 21h35, o último dia em que veria a moça do cabelo curto, cheguei atrasado. As pessoas da fila já haviam embarcado e o ônibus esperava, parado, a hora de sair. Passei pela roleta e logo a enxerguei, e bem atrás dela, um banco vago. Ela levantou os olhos do livro, me disse "olá, como vai?" e eu me sentei. Durante o trajeto, enquanto sentia seu perfume doce e olhava para seu pescoço delicado, me despedi em silêncio.
Pensei em escrever às pressas um bilhete, pensei em levantar e dizer a ela tudo de um fôlego só, pensei em deixar meu telefone, pensei em puxá-la pelo braço e beijá-la. Mas tudo o que fiz foi levantar-me, apertar o botão e descer no meu ponto. Pela última vez.
Covarde.
Nunca mais a vi.
Eu tinha de correr para pegar o das oito e trinta e cinco. Se perdesse, tinha de fazer hora em algum lugar e ir para a fila às nove e meia. Foi isso que aconteceu certa noite. E foi nessa noite que eu a vi.
Era uma moça delicada, de pele branca —e, imagino, macia—, cabelo cortado curtinho, preto. Usava roupas de bom gosto, discretas, femininas —saia, ai, essa minha queda por mulher de saia—, e um perfume suave de que me lembro até hoje. Carregava sempre umas bolsinhas pequenas, coloridas, o que denunciava um ar de menina. Braços finos, mãos delicadas, unhas pintadas de esmalte clarinho. Uma vez pude ver a tatuagem de cereja no ombro direito. Atrevi-me a olhar para seus olhos poucas vezes, e eram cinzentos, brilhantes, lindos. Linda.
Acabei descobrindo com o tempo que ela voltava para casa sempre no mesmo ônibus: o Alto Tarumã das nove e trinta e cinco. Passei, então, a, de propósito, perder todas as noites o ônibus das oito. Algumas vezes, quando eu chegava, ela já estava lá. Outras, eu não a via na fila, mas logo ela entrava num lugar lá atrás.
Numa noite sem nada de especial, cheguei na praça e vi que ela era a última da fila. Parei bem atrás dela e senti seu perfume. Então ela virou-se e perguntou, com um sorriso simpático, "tudo bem?". Respondi, surpreso. A voz era como tudo nela: delicada, doce.
Ficamos conhecidos. E a mim bastava somente isso. Não tínhamos relação nenhuma além dos cumprimentos de toda noite. Talvez, bobeira minha, uma amizade ou até um romance não tivessem me contentado tanto quanto esses simples "boa noite". Jamais cheguei a prolongar a conversa além de comentar, uma ou duas vezes, sobre o ônibus atrasado. Não sei explicar. Não queria parecer vulgar, nem demonstrar que a achava assim. Ou talvez ela fosse para mim meio inalcançável, quase irreal. Pura. Não sei.
Também não sei dizer se cheguei a me apaixonar. Sei que me atraíam sua beleza feminina e seus modos delicados, como se, depois de um dia de estudo e trabalho, encontrá-la na fila fosse um descanso. Minha recompensa por ter sido um bom menino. E, embora minha história pareça longa, foram poucas as noites em que a vi.
Numa terça-feira cheguei em casa e minha mãe me avisou da mudança. Casa de aluguel, sabe como é. O dono já pedira há algumas semanas e meu pai finalmente conseguira uma nova. Iríamos mudar já no fim de semana. Ótimo, sempre gostei de mudança, mas logo notei que teria de pegar outro ônibus para estudar e trabalhar e nunca mais veria a moça do cabelo curto.
A semana passou e eu a encontrei na fila como sempre. Não sabia o que fazer. Não sabia nem mesmo se devia fazer algo.
Na sexta-feira, o último dia em que eu tomava o Alto Tarumã das 21h35, o último dia em que veria a moça do cabelo curto, cheguei atrasado. As pessoas da fila já haviam embarcado e o ônibus esperava, parado, a hora de sair. Passei pela roleta e logo a enxerguei, e bem atrás dela, um banco vago. Ela levantou os olhos do livro, me disse "olá, como vai?" e eu me sentei. Durante o trajeto, enquanto sentia seu perfume doce e olhava para seu pescoço delicado, me despedi em silêncio.
Pensei em escrever às pressas um bilhete, pensei em levantar e dizer a ela tudo de um fôlego só, pensei em deixar meu telefone, pensei em puxá-la pelo braço e beijá-la. Mas tudo o que fiz foi levantar-me, apertar o botão e descer no meu ponto. Pela última vez.
Covarde.
Nunca mais a vi.
20.2.07
Comunicado
Acabou a viagem, acabaram as férias e acabaram os posts pessoais.
Voltamos agora com a nossa programação normal.
Voltamos agora com a nossa programação normal.
18.2.07
Diário de viagem - epílogo
O que fica depois de uma experiência como essa? Bom, depois que se volta de uma viagem assim, nada mais é como antes.
Não foram vinte dias como planejei, mas foram oito dos melhores dias da minha vida. Oito dias intensos, emocionantes. Se toda minha vida tenho vivido como cordeiro, então esses foram meus dias de leão. Eu testemunhei a imponência dos Andes, vi o azul do Titicaca, conheci a sabedoria de culturas milenares. Impossível permanecer impassível a isso.
Foi a hora da verdade. Coloquei em prática tudo o que aprendi durante a vida. Falei todos os idiomas que conheço - português, espanhol, inglês, francês e até japonês, quem diria -, lembrei-me do treinamento militar e das lições de geografia, queimei uns miolos na matemática, cuidei de minhas finanças, fiz minhas gambiarras. Usei até meu kung fu.
Conheci muitos e novos lugares. Lugares que me causaram tristeza, lugares que me trouxeram melancolia, lugares que me fizeram pensar na vida, lugares que me lembraram de Deus, lugares que me jogaram numa alegria imensa, lugares que me proporcionaram paz de espírito, lugares que me instigaram.
Mais que lugares, conheci gente. Mabel, a moça que me ajudou na Tam. Angel, a simpática sargento da polícia turística. René, o dono do hostal em Copacabana. Señora Maria, que dividiu comigo suas maçãs. Señora Mercedes, que me ensinou a rezar em espanhol. A garçonete do café em La Paz. Os taxistas todos que me conduziram. As cholitas e suas inseparáveis trouxinhas nas costas. Os policiais tão solícitos. O grupo de japoneses, as duas irmãs argentinas, os americanos, o casal de franceses... Tanta gente.
E mais que gente, eu conheci a mim mesmo. No fundo, no fundo se eu conheci algo nessa viagem, foi a mim mesmo. Muito do que eu pensava a meu respeito caiu por terra. E me descobri capaz de muita coisa que nem sequer imaginava. E, se antes eu era amigo de Deus, depois dessa, fiquei unha e carne com o Homem.
É bom estar em casa de novo. É bom sentar-me ao meu computador para saber dos amigos, tomar uma boa xícara de chá, pegar um chocolate na gaveta, escolher uma entre as minhas músicas preferidas para ouvir ou puxar um livro da prateleira para folhear, preguiçoso. Tudo isso agora tem uma profundidade maior, um significado que não se explica em palavras. Na minha própria cotação, o valor da minha vida subiu assombrosamente.
Gratidão é o que sinto agora. Sou grato a Deus, que me permitiu viajar e regressar a salvo. Sou grato ao povo da Bolívia, que me acolheu com tanto carinho. Grato à minha família, que, assim como me abençoou na partida, deu graças a Deus na volta. Grato ao meu tio, que me presenteou com os tickets da viagem e não mediu esforços para o meu "resgate". Grato aos amigos, que estiveram presentes com seus e-mails, comentários e até no silêncio de quem acompanha tudo sem dizer nada. Meu mais sincero "muito obrigado", espero um dia poder retribuir tudo a todos.
E se, num dia qualquer, alguém me pegar olhando, distraído, pela janela, que não me chame à realidade. Não me interrompa. Estarei planejando minha próxima aventura, pensando qual o novo horizonte a perseguir.
* * *
p.s. Só uma coisa me frustra. Vi uma só lhama durante toda a viagem, e nem consegui tirar foto. Ainda vai demorar um pouco para engolir essa.
Não foram vinte dias como planejei, mas foram oito dos melhores dias da minha vida. Oito dias intensos, emocionantes. Se toda minha vida tenho vivido como cordeiro, então esses foram meus dias de leão. Eu testemunhei a imponência dos Andes, vi o azul do Titicaca, conheci a sabedoria de culturas milenares. Impossível permanecer impassível a isso.
Foi a hora da verdade. Coloquei em prática tudo o que aprendi durante a vida. Falei todos os idiomas que conheço - português, espanhol, inglês, francês e até japonês, quem diria -, lembrei-me do treinamento militar e das lições de geografia, queimei uns miolos na matemática, cuidei de minhas finanças, fiz minhas gambiarras. Usei até meu kung fu.
Conheci muitos e novos lugares. Lugares que me causaram tristeza, lugares que me trouxeram melancolia, lugares que me fizeram pensar na vida, lugares que me lembraram de Deus, lugares que me jogaram numa alegria imensa, lugares que me proporcionaram paz de espírito, lugares que me instigaram.
Mais que lugares, conheci gente. Mabel, a moça que me ajudou na Tam. Angel, a simpática sargento da polícia turística. René, o dono do hostal em Copacabana. Señora Maria, que dividiu comigo suas maçãs. Señora Mercedes, que me ensinou a rezar em espanhol. A garçonete do café em La Paz. Os taxistas todos que me conduziram. As cholitas e suas inseparáveis trouxinhas nas costas. Os policiais tão solícitos. O grupo de japoneses, as duas irmãs argentinas, os americanos, o casal de franceses... Tanta gente.
E mais que gente, eu conheci a mim mesmo. No fundo, no fundo se eu conheci algo nessa viagem, foi a mim mesmo. Muito do que eu pensava a meu respeito caiu por terra. E me descobri capaz de muita coisa que nem sequer imaginava. E, se antes eu era amigo de Deus, depois dessa, fiquei unha e carne com o Homem.
É bom estar em casa de novo. É bom sentar-me ao meu computador para saber dos amigos, tomar uma boa xícara de chá, pegar um chocolate na gaveta, escolher uma entre as minhas músicas preferidas para ouvir ou puxar um livro da prateleira para folhear, preguiçoso. Tudo isso agora tem uma profundidade maior, um significado que não se explica em palavras. Na minha própria cotação, o valor da minha vida subiu assombrosamente.
Gratidão é o que sinto agora. Sou grato a Deus, que me permitiu viajar e regressar a salvo. Sou grato ao povo da Bolívia, que me acolheu com tanto carinho. Grato à minha família, que, assim como me abençoou na partida, deu graças a Deus na volta. Grato ao meu tio, que me presenteou com os tickets da viagem e não mediu esforços para o meu "resgate". Grato aos amigos, que estiveram presentes com seus e-mails, comentários e até no silêncio de quem acompanha tudo sem dizer nada. Meu mais sincero "muito obrigado", espero um dia poder retribuir tudo a todos.
E se, num dia qualquer, alguém me pegar olhando, distraído, pela janela, que não me chame à realidade. Não me interrompa. Estarei planejando minha próxima aventura, pensando qual o novo horizonte a perseguir.
* * *
p.s. Só uma coisa me frustra. Vi uma só lhama durante toda a viagem, e nem consegui tirar foto. Ainda vai demorar um pouco para engolir essa.
14.2.07
A volta
Saí de Copacabana meio fugido. Não quis nem saber de mais fotos do caminho, nem de lago Titicaca, nem de puxar papo com ninguém. Cheguei em La Paz e fui à embaixada brasileira. Não sei dizer por quê, sinceramente. Talvez esperasse deles alguma ajuda, alguma assistência, alguma companhia para ir até a polícia, coisas que não tive. Fui atendido por um engomadinho de gel no cabelo que torceu o nariz para mim e minha mochila e quase me pega com a pontinha dos dedos para me jogar no lixo.
De lá, fui à Polícia Turística prestar queixa novamente, já que o policial de Copacabana havia me dito que os procurasse, pois era um crime contra estrangeiro e, de acordo com as regras deles, tinha que ficar registrado lá. Até para sermos roubados, enfrentamos burocracia. Fui muito bem tratado por uma sargento a paisana, simpática, que lamentou o acontecido e pediu desculpas em nome do povo boliviano. Não precisava.
Deixei as coisas num hotel e fui até a rodoviária, para garantir meu lugar no primeiro ônibus da manhã para Cochabamba. Não quis mais passear, fiquei no hotel assistindo Rede Globo internacional - sim, fiquei num hotel melhorzinho, como um prêmio a mim mesmo. Mesmo assim, não consegui dormir bem, estava apreensivo, com medo de não conseguir adiantar o vôo.
Foi uma longa viagem para Cocha. Me incomodava o boliviano com o menino chato no colo, o filme do Schwarzeneger dublado em espanhol na TV, aquela paisagem monótona lá fora. Se pudesse, eu desceria da lata velha e iria a pé mesmo. No que estacionou o ônibus, às 17h00, desci na frente dos outros passageiros, peguei minha mochila e entrei num táxi, direto para o aeroporto. Corri no guichê da Tam e, um banho de água fria, não havia ninguém lá. Perguntei na companhia ao lado e descobri que eles só trabalham no aeroporto até as 14h30. Quase chorei, mas mantive a calma, que não era hora de dar uma de bebezão. Agora eu tinha que ser prático.
Procurei nas minhas anotações e achei o endereço da loja deles, no centro de Cochabamba. Nem que desse com a cara na porta de novo, tinha que tentar, ainda no mesmo dia, resolver tudo. Outro táxi - motorista muito simpático, por sinal, viemos conversando sobre futebol - e, sorte, loja aberta.
Entrei no escritório e perguntei se alguém falava português, o que facilitaria minha vida e a deles. Bingo! Atendeu-me uma moça simpática, que morou dois anos em Curitiba e ficou visivelmente preocupada assim que contei meu caso. Nem pediu maiores explicações, falou com o gerente e já me reservou lugar no próximo vôo. Que alívio! Ainda faltavam algumas formalidades aqui no Brasil, mas o lugar estava garantido.
No dia seguinte, voltei ao escritório da Tam para buscar as passagens. Dei risada da situação quando notei que eles já estavam me esperando. Todos os funcionários já sabiam do meu caso e aguardavam, preocupados, a hora em que eu aparecesse, a moça da recepção já me mandou subir direto na sala da minha amiga curitibana. Pelo visto, causei confusão e fiquei famoso lá. O próprio gerente emitiu e me entregou os tickets, desejando uma boa viagem. Brasil à vista!
Peguei as coisas no hotel e fui para o aeroporto. O papo com o taxista foi tão animado que nem notei quando chegou. Fiz check-in e fiquei esperando o avião, o abençoado avião que me levaria de volta para o Brasil. Lembrei da lição que aprendi, menino pequeno, com a Dorothy, do Mágico de Oz: "não há lugar como o lar". E eu estava voltando para o meu.
Ao levantar o pé para subir o primeiro degrau da escada do avião, pisei pela última vez em solo boliviano e fiz uma prece silenciosa a Deus, meu companheiro inseparável de todas as aventuras. O tempo estava muito nublado, e lá de cima não pude mais ver os Andes.
De lá, fui à Polícia Turística prestar queixa novamente, já que o policial de Copacabana havia me dito que os procurasse, pois era um crime contra estrangeiro e, de acordo com as regras deles, tinha que ficar registrado lá. Até para sermos roubados, enfrentamos burocracia. Fui muito bem tratado por uma sargento a paisana, simpática, que lamentou o acontecido e pediu desculpas em nome do povo boliviano. Não precisava.
Deixei as coisas num hotel e fui até a rodoviária, para garantir meu lugar no primeiro ônibus da manhã para Cochabamba. Não quis mais passear, fiquei no hotel assistindo Rede Globo internacional - sim, fiquei num hotel melhorzinho, como um prêmio a mim mesmo. Mesmo assim, não consegui dormir bem, estava apreensivo, com medo de não conseguir adiantar o vôo.
Foi uma longa viagem para Cocha. Me incomodava o boliviano com o menino chato no colo, o filme do Schwarzeneger dublado em espanhol na TV, aquela paisagem monótona lá fora. Se pudesse, eu desceria da lata velha e iria a pé mesmo. No que estacionou o ônibus, às 17h00, desci na frente dos outros passageiros, peguei minha mochila e entrei num táxi, direto para o aeroporto. Corri no guichê da Tam e, um banho de água fria, não havia ninguém lá. Perguntei na companhia ao lado e descobri que eles só trabalham no aeroporto até as 14h30. Quase chorei, mas mantive a calma, que não era hora de dar uma de bebezão. Agora eu tinha que ser prático.
Procurei nas minhas anotações e achei o endereço da loja deles, no centro de Cochabamba. Nem que desse com a cara na porta de novo, tinha que tentar, ainda no mesmo dia, resolver tudo. Outro táxi - motorista muito simpático, por sinal, viemos conversando sobre futebol - e, sorte, loja aberta.
Entrei no escritório e perguntei se alguém falava português, o que facilitaria minha vida e a deles. Bingo! Atendeu-me uma moça simpática, que morou dois anos em Curitiba e ficou visivelmente preocupada assim que contei meu caso. Nem pediu maiores explicações, falou com o gerente e já me reservou lugar no próximo vôo. Que alívio! Ainda faltavam algumas formalidades aqui no Brasil, mas o lugar estava garantido.
No dia seguinte, voltei ao escritório da Tam para buscar as passagens. Dei risada da situação quando notei que eles já estavam me esperando. Todos os funcionários já sabiam do meu caso e aguardavam, preocupados, a hora em que eu aparecesse, a moça da recepção já me mandou subir direto na sala da minha amiga curitibana. Pelo visto, causei confusão e fiquei famoso lá. O próprio gerente emitiu e me entregou os tickets, desejando uma boa viagem. Brasil à vista!
Peguei as coisas no hotel e fui para o aeroporto. O papo com o taxista foi tão animado que nem notei quando chegou. Fiz check-in e fiquei esperando o avião, o abençoado avião que me levaria de volta para o Brasil. Lembrei da lição que aprendi, menino pequeno, com a Dorothy, do Mágico de Oz: "não há lugar como o lar". E eu estava voltando para o meu.
Ao levantar o pé para subir o primeiro degrau da escada do avião, pisei pela última vez em solo boliviano e fiz uma prece silenciosa a Deus, meu companheiro inseparável de todas as aventuras. O tempo estava muito nublado, e lá de cima não pude mais ver os Andes.
12.2.07
O assalto
Saindo do Cerro Calvario, não há outro jeito para voltar para cidade senão passar por umas quebradas. Feias. Mais feias que as mais feias do Brasil. Começava a chover, e eu nem pensei no perigo da ruela deserta.
Quando cheguei na primeira esquina, pularam dois homens, ambos armados, encapuzados. Não pude pensar muita coisa - muito menos fazer - antes que me abordassem. Um revistou-me os bolsos, além de dar uns incômodos cutucões com o revólver, enquanto o outro vigiava e me apontava a arma. Não sei porque, não se interessaram pela mochila. Mantive a calma que era possível. O bandido apalpou o bolso onde estava a câmera e não a quis, porque pensou que era um celular - ufa!. Queriam dinheiro. E foi o que ele achou no cinto escondido debaixo da calça. Puxou e jogou para o companheiro, enquanto me chutou por trás da perna. Quando caí de joelhos, ele engatilhou e encostou o revólver na minha cabeça.
O outro colocou a arma atrás, presa na calça e começou a fuçar no cinto - que é como uma pequena pochete, onde se põe documentos e dinheiro escondidos por baixo da roupa. Acho que foi o momento mais tenso que eu jamais vivi: ajoelhado, a milhares de quilômetros de casa, com uma arma engatilhada apontada para minha cabeça, imaginando se ela seria disparada ou não.
Incrível como nessa hora a gente pensa rápido. Num segundo eu pensei em dezenas de coisas. Vi minha vida passar diante dos olhos, pensei na minha mãe em casa, chorando um filho que nunca voltaria. Na minha cabeça, confusa como estava, tudo estava perdido, e foi aí que decidi reagir. Se fosse aquela a minha hora, eu partiria em pé.
Sabe Deus com que coragem, eu segurei a mão com que o bandido segurava a arma, e me levantei sabe Deus com que agilidade. Bati com meu antebraço no cotovelo dele, forçando para cima, e puxei sua mão para baixo, fazendo força contra o movimento natural da articulação. Ouvi um barulho horrível e vi sangue e um pedaço do osso. Fratura exposta. Benditos treinos de kung fu que me ensinaram a técnica. O outro mal teve tempo de se virar, o golpeei na nuca com as duas mãos, com tanta força que o joguei de cara na parede.
Saí correndo sem olhar para trás. Confiei em Deus. Ele tinha me dado força para reagir, e com certeza Ele faria com que não atirassem em mim. Imaginei que tinha posto os dois fora de combate, mas não quis olhar para me certificar. Acho que bati o recorde mundial dos 100 metros rasos, pena que não tinha ninguém para testemunhar no comitê olímpico.
Cheguei na avenida, pedindo ajuda e a polícia veio rápido, acho que estavam ali por perto. Logo juntou uma platéia de curiosos enquanto eu contava o caso. Nem reparei que estava falando português, a mil por hora, e ninguém entendia lhufas. Respirei fundo e expliquei de novo, en español.
Um senhor me acompanhou até a delegacia enquanto os guardas saíram atrás dos bandidos. Acho que o sargento não acreditou muito na minha história, até que voltaram os dois policiais dizendo que não encontraram ninguém. Porém, viram no local uma poça grande de sangue e mais um pouco escorrido numa parede, como se alguém tivesse batido o rosto. Deduzi que, além do braço, quebrei um nariz na fuga.
Voltei para o hostal e só aí caí em mim. Acho que eu devia esconder esta parte, mas chorei por umas duas horas, desesperado. Decidi que não queria mais ficar naquele lugar. Fim de viagem para mim. Demorou para conseguir recobrar o controle.
Anoiteceu e fui na lan house, pensando em como dar a notícia. Acabei contando a verdade de uma vez só, nua e crua. Estava tão burro que não consegui pensar num jeito mais suave. Não dormi aquela noite. Lá pelas 4h00, cochilei um pouco, sonhei que uns homens me procuravam no hostal, um com o braço engessado, e acordei assustado.
Arrumei minhas coisas para sair cedinho, de volta para La Paz. Quando estava lavando o rosto, bateram na minha porta. Prendi a respiração, devo ter ficado branco como cera. Foi um alívio ouvir que era a polícia. Haviam achado meu cinto com o passaporte jogados na região do assalto e vieram me devolver. Um pessoal muito atencioso.
Mas, mesmo assim, para mim já tinha sido demais. Já havia decidido que iria para casa. Estava a poucos quilômetros da fronteira com o Peru, mas voltei para trás. Embarquei no primeiro ônibus para La Paz, às oito da manhã.
O grosso do dinheiro estava escondido - com licença, senhoras e senhoritas - na cueca. Mesmo assim, foi um prejuízo considerável. Saldo final: perdi 120 dólares, 20 bolivianos, 30 reais e o cartão de crédito. O passaporte, como contei, consegui de volta.
Mas saí inteiro, o que me valeu mais que todo o dinheiro que eles poderiam ter levado. Mais que todo o dinheiro que eu ganhe em toda a minha vida. Nuestra Señora de Copacabana me livrou de uma boa enrascada.
Quando cheguei na primeira esquina, pularam dois homens, ambos armados, encapuzados. Não pude pensar muita coisa - muito menos fazer - antes que me abordassem. Um revistou-me os bolsos, além de dar uns incômodos cutucões com o revólver, enquanto o outro vigiava e me apontava a arma. Não sei porque, não se interessaram pela mochila. Mantive a calma que era possível. O bandido apalpou o bolso onde estava a câmera e não a quis, porque pensou que era um celular - ufa!. Queriam dinheiro. E foi o que ele achou no cinto escondido debaixo da calça. Puxou e jogou para o companheiro, enquanto me chutou por trás da perna. Quando caí de joelhos, ele engatilhou e encostou o revólver na minha cabeça.
O outro colocou a arma atrás, presa na calça e começou a fuçar no cinto - que é como uma pequena pochete, onde se põe documentos e dinheiro escondidos por baixo da roupa. Acho que foi o momento mais tenso que eu jamais vivi: ajoelhado, a milhares de quilômetros de casa, com uma arma engatilhada apontada para minha cabeça, imaginando se ela seria disparada ou não.
Incrível como nessa hora a gente pensa rápido. Num segundo eu pensei em dezenas de coisas. Vi minha vida passar diante dos olhos, pensei na minha mãe em casa, chorando um filho que nunca voltaria. Na minha cabeça, confusa como estava, tudo estava perdido, e foi aí que decidi reagir. Se fosse aquela a minha hora, eu partiria em pé.
Sabe Deus com que coragem, eu segurei a mão com que o bandido segurava a arma, e me levantei sabe Deus com que agilidade. Bati com meu antebraço no cotovelo dele, forçando para cima, e puxei sua mão para baixo, fazendo força contra o movimento natural da articulação. Ouvi um barulho horrível e vi sangue e um pedaço do osso. Fratura exposta. Benditos treinos de kung fu que me ensinaram a técnica. O outro mal teve tempo de se virar, o golpeei na nuca com as duas mãos, com tanta força que o joguei de cara na parede.
Saí correndo sem olhar para trás. Confiei em Deus. Ele tinha me dado força para reagir, e com certeza Ele faria com que não atirassem em mim. Imaginei que tinha posto os dois fora de combate, mas não quis olhar para me certificar. Acho que bati o recorde mundial dos 100 metros rasos, pena que não tinha ninguém para testemunhar no comitê olímpico.
Cheguei na avenida, pedindo ajuda e a polícia veio rápido, acho que estavam ali por perto. Logo juntou uma platéia de curiosos enquanto eu contava o caso. Nem reparei que estava falando português, a mil por hora, e ninguém entendia lhufas. Respirei fundo e expliquei de novo, en español.
Um senhor me acompanhou até a delegacia enquanto os guardas saíram atrás dos bandidos. Acho que o sargento não acreditou muito na minha história, até que voltaram os dois policiais dizendo que não encontraram ninguém. Porém, viram no local uma poça grande de sangue e mais um pouco escorrido numa parede, como se alguém tivesse batido o rosto. Deduzi que, além do braço, quebrei um nariz na fuga.
Voltei para o hostal e só aí caí em mim. Acho que eu devia esconder esta parte, mas chorei por umas duas horas, desesperado. Decidi que não queria mais ficar naquele lugar. Fim de viagem para mim. Demorou para conseguir recobrar o controle.
Anoiteceu e fui na lan house, pensando em como dar a notícia. Acabei contando a verdade de uma vez só, nua e crua. Estava tão burro que não consegui pensar num jeito mais suave. Não dormi aquela noite. Lá pelas 4h00, cochilei um pouco, sonhei que uns homens me procuravam no hostal, um com o braço engessado, e acordei assustado.
Arrumei minhas coisas para sair cedinho, de volta para La Paz. Quando estava lavando o rosto, bateram na minha porta. Prendi a respiração, devo ter ficado branco como cera. Foi um alívio ouvir que era a polícia. Haviam achado meu cinto com o passaporte jogados na região do assalto e vieram me devolver. Um pessoal muito atencioso.
Mas, mesmo assim, para mim já tinha sido demais. Já havia decidido que iria para casa. Estava a poucos quilômetros da fronteira com o Peru, mas voltei para trás. Embarquei no primeiro ônibus para La Paz, às oito da manhã.
O grosso do dinheiro estava escondido - com licença, senhoras e senhoritas - na cueca. Mesmo assim, foi um prejuízo considerável. Saldo final: perdi 120 dólares, 20 bolivianos, 30 reais e o cartão de crédito. O passaporte, como contei, consegui de volta.
Mas saí inteiro, o que me valeu mais que todo o dinheiro que eles poderiam ter levado. Mais que todo o dinheiro que eu ganhe em toda a minha vida. Nuestra Señora de Copacabana me livrou de uma boa enrascada.
11.2.07
Acabou, por enquanto
Acabou minha aventura.
Meu pior medo aqui acabou acontecendo. Fui assaltado hoje, em Copacabana.
Resumindo a história: dois caras levaram meu passaporte, algum dinheiro e meu cartão de crédito. Mas agora já está tudo bem. Deus me livrou dessa, como Ele sempre faz.
Só tomei uma decisão: peguei minhas tralhas e voltei hoje para La Paz. Amanhã vou a Cochabamba. Se Deus quiser, consigo transferir meu vôo e volto para casa o quanto antes.
Desculpem a todos que torciam para que eu chegasse até Machu Picchu. Fiquei no meio do caminho. Como levaram meu passaporte, não posso mais atravessar para o Peru. E depois do que passei, perdi o gosto da coisa. Até poderia continuar por outros lugares, mas acabei decidindo assim. Existem horas de avançar e horas de recuar. Eu vou recuar. Por enquanto.
Mas valeu a experiência. Cumpri metade da minha viagem, conheci todos os lugares que queria na Bolívia. Faltou a outra metade, no Peru.
Nao culpo ninguém pelo que aconteceu. Deus sabe o que faz e eu sou grato por saído inteiro dessa. Aprendi muita coisa durante a viagem, e devo muito aos bolivianos por isso. E tenho certeza que os dois que estragaram tudo não representam todo esse povo tão querido que me acolheu tão bem.
Fico com uma pendência com Machu Picchu. Um dia volto para acertarmos os ponteiros. E quem quiser me acompanhar, esteja convidado desde já.
Meu pior medo aqui acabou acontecendo. Fui assaltado hoje, em Copacabana.
Resumindo a história: dois caras levaram meu passaporte, algum dinheiro e meu cartão de crédito. Mas agora já está tudo bem. Deus me livrou dessa, como Ele sempre faz.
Só tomei uma decisão: peguei minhas tralhas e voltei hoje para La Paz. Amanhã vou a Cochabamba. Se Deus quiser, consigo transferir meu vôo e volto para casa o quanto antes.
Desculpem a todos que torciam para que eu chegasse até Machu Picchu. Fiquei no meio do caminho. Como levaram meu passaporte, não posso mais atravessar para o Peru. E depois do que passei, perdi o gosto da coisa. Até poderia continuar por outros lugares, mas acabei decidindo assim. Existem horas de avançar e horas de recuar. Eu vou recuar. Por enquanto.
Mas valeu a experiência. Cumpri metade da minha viagem, conheci todos os lugares que queria na Bolívia. Faltou a outra metade, no Peru.
Nao culpo ninguém pelo que aconteceu. Deus sabe o que faz e eu sou grato por saído inteiro dessa. Aprendi muita coisa durante a viagem, e devo muito aos bolivianos por isso. E tenho certeza que os dois que estragaram tudo não representam todo esse povo tão querido que me acolheu tão bem.
Fico com uma pendência com Machu Picchu. Um dia volto para acertarmos os ponteiros. E quem quiser me acompanhar, esteja convidado desde já.
Turismo religioso
Depois do café da manhã na sarjeta com meu amigo vira-lata, dei uma caminhada à beira do titicaca. Mesmo nublado, é uma bela visão. Uma neblina envolve as montanhas, fica tudo com um ar meio bucólico. Aliás, "bucólico" é a palavra para descrever o campo aqui em volta da cidade, com murinhos baixinhos de pedra e flores plantadas. Parece que a vida ao redor do lago é mais fácil, tudo é mais verdinho.
Depois fui à Basílica de Nuestra Señora de Copacabana. Tirei meia dúzia de fotos por fora e entrei. Não tenho como descrever meu choque. Foi a visão mais magnífica que eu tive em toda a viagem. A parede do altar-mor tem coisa de uns 15 metros de altura, toda em ouro, trabalhada com motivos barrocos. Bem ao centro, num lugar que de mais destaque não poderia ser, está a imagem da Virgem de Copacabana, dentro de um relicário de prata. É lindíssima, com um manto que cai drapejado até quase tocar o sacrário. Devia ser missa solene - domingo de manhã -, e cantava um coro de crianças, que eu bem acreditaria serem anjos.
Coincidência ou não - eu, particularmente, não acredito que tenha sido -, a missa estava começando naquele exato momento. E eu nem tinha visto horas, nem nada! O ritual é o mesmíssimo do Brasil. Não entendi tudo que o bispo falava, mas respondia em português porque sabia que parte da liturgia estávamos. Rezei o Pai-Nosso também em português - aprendi só a Ave-Maria en español -, bem baixinho para ninguém reparar.
Cá entre nós, o povo me decepcionou um pouco. Entram e saem o tempo todo. Grande parte fica sentada durante toda a missa. E dos que ainda têm a consideração de se levantar, só uma parte se ajoelha na hora da consagração. São apáticos, não respondem as orações e não prestam atenção na homilia. Mas enfim.
Ah, também para minha decepção, havia um cartaz bem grande: prohibido sacar fotografias. Respeitei. Azar de vocês, que não verão como é lá dentro. Eu guardarei a imagem para sempre na memória, e num lugar bem especial.
Depois da missa, fui à capela das velas e acendi uma, rezando pelo nosso povo brasileiro. Dei esmola a duas cholitas que pediam na saída.
Almocei e fui subir o Cerro Calvario. Uma montanha onde existe uma via sacra, com as 15 estações da paixão de Cristo. Fiquei orgulhoso porque subi no maior fôlego, rezando e deixando tudo quanto é boliviano e gringo para trás. Mas, claro, tive que parar uma ou duas vezes para tomar um arzinho. É pedreira!
As estações não chegam a impressionar muito. São umas cruzes de pedra em cima de pedestais onde se lê o nome da família que a ofertou. Pelo que vi, os peregrinos sobem o Cerro desde o século XIX. Antes de chegar na 15a estação, dá-se um intervalo e a gente pode ver altares com as sete dores da Virgem Maria. Lembrei da minha mãe.
A décima quinta estação, a ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo fica bem no ponto mais alto do morro - também o ponto mais alto da minha viagem, 4400 metros acima do mar. Uma cruz enorme, com centenas de velas queimando em baixo. Me emocionei.
Lá em cima, a paisagem compensa qualquer sacrifício. Tem-se uma visão privilegiada da cidade e de todo o lago. Até onde a vista alcança, é um azul sem fim. Lá longe, a Ilha do Sol, e na outra margem - que não se pode enxergar -, o Peru. É de perder o fôlego. Se bem que fôlego, já o perdemos na subida.
Enquanto eu tirava minhas fotos, começou a chover. Ainda bem que não era granizo dessa vez. Lá em baixo, as gotas da garoa se juntavam às serenas águas do Titicaca.
Depois fui à Basílica de Nuestra Señora de Copacabana. Tirei meia dúzia de fotos por fora e entrei. Não tenho como descrever meu choque. Foi a visão mais magnífica que eu tive em toda a viagem. A parede do altar-mor tem coisa de uns 15 metros de altura, toda em ouro, trabalhada com motivos barrocos. Bem ao centro, num lugar que de mais destaque não poderia ser, está a imagem da Virgem de Copacabana, dentro de um relicário de prata. É lindíssima, com um manto que cai drapejado até quase tocar o sacrário. Devia ser missa solene - domingo de manhã -, e cantava um coro de crianças, que eu bem acreditaria serem anjos.
Coincidência ou não - eu, particularmente, não acredito que tenha sido -, a missa estava começando naquele exato momento. E eu nem tinha visto horas, nem nada! O ritual é o mesmíssimo do Brasil. Não entendi tudo que o bispo falava, mas respondia em português porque sabia que parte da liturgia estávamos. Rezei o Pai-Nosso também em português - aprendi só a Ave-Maria en español -, bem baixinho para ninguém reparar.
Cá entre nós, o povo me decepcionou um pouco. Entram e saem o tempo todo. Grande parte fica sentada durante toda a missa. E dos que ainda têm a consideração de se levantar, só uma parte se ajoelha na hora da consagração. São apáticos, não respondem as orações e não prestam atenção na homilia. Mas enfim.
Ah, também para minha decepção, havia um cartaz bem grande: prohibido sacar fotografias. Respeitei. Azar de vocês, que não verão como é lá dentro. Eu guardarei a imagem para sempre na memória, e num lugar bem especial.
Depois da missa, fui à capela das velas e acendi uma, rezando pelo nosso povo brasileiro. Dei esmola a duas cholitas que pediam na saída.
Almocei e fui subir o Cerro Calvario. Uma montanha onde existe uma via sacra, com as 15 estações da paixão de Cristo. Fiquei orgulhoso porque subi no maior fôlego, rezando e deixando tudo quanto é boliviano e gringo para trás. Mas, claro, tive que parar uma ou duas vezes para tomar um arzinho. É pedreira!
As estações não chegam a impressionar muito. São umas cruzes de pedra em cima de pedestais onde se lê o nome da família que a ofertou. Pelo que vi, os peregrinos sobem o Cerro desde o século XIX. Antes de chegar na 15a estação, dá-se um intervalo e a gente pode ver altares com as sete dores da Virgem Maria. Lembrei da minha mãe.
A décima quinta estação, a ressurreição de Nosso Senhor Jesus Cristo fica bem no ponto mais alto do morro - também o ponto mais alto da minha viagem, 4400 metros acima do mar. Uma cruz enorme, com centenas de velas queimando em baixo. Me emocionei.
Lá em cima, a paisagem compensa qualquer sacrifício. Tem-se uma visão privilegiada da cidade e de todo o lago. Até onde a vista alcança, é um azul sem fim. Lá longe, a Ilha do Sol, e na outra margem - que não se pode enxergar -, o Peru. É de perder o fôlego. Se bem que fôlego, já o perdemos na subida.
Enquanto eu tirava minhas fotos, começou a chover. Ainda bem que não era granizo dessa vez. Lá em baixo, as gotas da garoa se juntavam às serenas águas do Titicaca.
Uma noite e uma manhã
Ontem à noite, quando saia da lan house, uma moça simpática me puxou pelo braco e entregou o folheto do restaurante dela, logo em frente. Entrei.
E que lugar legal. Super aconchegante, com lareira e mesas iluminadas por velas. Quem diria que eu jantaria à luz de velas, na Bolívia!
Tomei uma sopa deliciosa de milho enquanto conversava com o garçom que - surpresa! - morou por dois anos em São Paulo. Depois começaram a tocar e cantar dois argentinos. Me senti um cidadão do mundo, a milhares de quilômetros de casa, com gente do mundo inteiro, ouvindo música argentina e comendo comida andina. Pedi até uma cerveja, a famosa Paceña. É boa, um pouco mais aguada, mas tem sabor melhor que as do Brasil. O garçom me disse que foi eleita a segunda melhor cerveja do mundo, não sei se é conversa dele.
Acabei descobrindo que a avenida onde eu estou hospedado é um reduto de barzinhos e restaurantes, um mais charmoso que o outro. Aqui é lugar de gente bonita, a maior parte dos turistas são jovens e à noite a cidade - pelo menos a calle Seis de Agosto - é bem movimentada.
* * *
Hoje o dia amanheceu chuvoso. Achei bom porque assim descanso um pouco e nao me queimo mais de sol - estou vermelho que nem um alemão.
O pessoal aqui acorda tarde. Às 9h00 não encontrei nenhum lugar para tomar café. Acabei comprando duas salteñas de uma chola na rua, petiscos que dividi com um vira-lata que virou meu amigo.
Fiquei ali, sentado na sarjeta, com o cachorro do lado, olhando para o lago. Dá uma paz enorme. Dali a pouco veio o menino que cuida do hotel conversar comigo. Fez mil perguntas sobre o Brasil.
O legal aqui é que todos te tratam com amigo, inclusive no linguajar. É "hola, amigo", "buenos dias, amigo" e "gracias, amigo" para tudo quanto é lado.
Depois de cinco dias de viagem, ya me quedé boliviano de corazón. ¡Viva Bolivia!
* * *
Pai, eu terminei de ler ontem o livro do Amyr Klink. Comprei no aeroporto enquanto esperava o vôo. Olha, fiquei inspirado, viu?
E, mãe, estou com saudade. É chato chegar em "casa" à noite e nao ter você para conversar.
E que lugar legal. Super aconchegante, com lareira e mesas iluminadas por velas. Quem diria que eu jantaria à luz de velas, na Bolívia!
Tomei uma sopa deliciosa de milho enquanto conversava com o garçom que - surpresa! - morou por dois anos em São Paulo. Depois começaram a tocar e cantar dois argentinos. Me senti um cidadão do mundo, a milhares de quilômetros de casa, com gente do mundo inteiro, ouvindo música argentina e comendo comida andina. Pedi até uma cerveja, a famosa Paceña. É boa, um pouco mais aguada, mas tem sabor melhor que as do Brasil. O garçom me disse que foi eleita a segunda melhor cerveja do mundo, não sei se é conversa dele.
Acabei descobrindo que a avenida onde eu estou hospedado é um reduto de barzinhos e restaurantes, um mais charmoso que o outro. Aqui é lugar de gente bonita, a maior parte dos turistas são jovens e à noite a cidade - pelo menos a calle Seis de Agosto - é bem movimentada.
* * *
Hoje o dia amanheceu chuvoso. Achei bom porque assim descanso um pouco e nao me queimo mais de sol - estou vermelho que nem um alemão.
O pessoal aqui acorda tarde. Às 9h00 não encontrei nenhum lugar para tomar café. Acabei comprando duas salteñas de uma chola na rua, petiscos que dividi com um vira-lata que virou meu amigo.
Fiquei ali, sentado na sarjeta, com o cachorro do lado, olhando para o lago. Dá uma paz enorme. Dali a pouco veio o menino que cuida do hotel conversar comigo. Fez mil perguntas sobre o Brasil.
O legal aqui é que todos te tratam com amigo, inclusive no linguajar. É "hola, amigo", "buenos dias, amigo" e "gracias, amigo" para tudo quanto é lado.
Depois de cinco dias de viagem, ya me quedé boliviano de corazón. ¡Viva Bolivia!
* * *
Pai, eu terminei de ler ontem o livro do Amyr Klink. Comprei no aeroporto enquanto esperava o vôo. Olha, fiquei inspirado, viu?
E, mãe, estou com saudade. É chato chegar em "casa" à noite e nao ter você para conversar.
10.2.07
Copacabana
Estou agora em Copacabana. "La playa de Bolivia". E sabem o que descobri? A Copacabana do Rio tem esse nome em homenagem a esta aqui. É mole?
Peguei um taxi em La Paz para ir até a zona do cementerio, de onde saem os ônibus para esta região. O taxista era muito simpático e viemos toda a viagem trocando figurinhas sobre nossos países. No que desci do taxi, um motorista já me puxou e ofereceu passagem para Copacabana. É como eu já disse: aqui tudo se ganha no grito.
A viagem é muito bonita. A estrada passa ainda mais perto dos picos nevados e eu fiquei com mais vontade de ver a neve. Mas nada de llamas.
No meio do caminho, paramos para pegar uma cholita - já criei carinho por elas, falo no diminutivo. E adivinhem? Ela embarcou com quatro ovelhas. Quatro ovelhas! O motorista e o cobrador fizeram uma forca danada para colocar as bicinhas em cima da van, no rack de bagagens. Foram balindo de lá até aqui e uma senhora ficou gritando, horrorizada: "pobrecitas, pobrecitas!"
O caminho segue até que chegamos numa cidadezinha num estreito do lago, Tiquina. o povoado fica metade de um lado, metade do outro. Os ônibus e carros passam em balsas grandes, mas os passageiros passam separados, em lanchas. A senhora do "pobrecitas" veio histérica, gritando de medo e invocando a Virgen Maria de uma margem até a outra. E nesta hora tem que ser muito esperto: você tem que ficar de olho onde desembarca seu ônibus e correr atrás dele antes que vá embora e te largue lá. Os motoristas não parecem muito pacientes, não.
Numa das margens do estreito, um prédio imponente, sede da gloriosa Armada Mariña Boliviana. Coitados, a marinha deles não tem mar, que triste isso.
Ah, sim, o lago. É grande. Enorme. Se me dissessem que é mar, eu acreditaria. É todo rodeado de montanhas, agora sim verdinhas. As águas são calmas, quase paradas, dá pra ver as nuvens refletidas. É fácil entender porque o povo daqui ama tanto o Titicaca.
Copacabana é um cidade pequena, bem a beira do lago. É, bem dizer, a praia dos bolivianos. Eles se sentam na beira do lago, brincam com as com as crianças, tomam cerveja, tiram fotos e tudo o mais que se faz numa praia. Com a exceção que nao se entra na água. É muito gelada - inclusive todo mundo fica de blusa na praia - e o chão nao é de areia, mas de pedra. No máximo dá para molhar os pezinhos, mas o cabra tem que ser macho.
Existe um calçadão em volta do lago, com bancos para sentar. Nao é grande coisa, mas dá para o gasto. Também há pedalinhos, caiaques e bicicletas para alugar. Existem muitas montanhas ao redor, uma mais bonita que a outra. Na maior delas, o Cerro Calvario, se pode subir por uma trilha.
Pelo que vi, aqui é a cidade dos bicho-grilo bolivianos. Tem hippies na rua vendendo artesanato, que nem no Brasil. Inclusive são os mesmos brinquinhos, colarzinhos e estatuetas de duendes. Os gringos que vem para cá são também todos do mesmo estilo. Eu até soltei o cabelo para nao parecer muito engomadinho.
A cidade vive em torno da enorme basílica que existe aqui. Muito grande mesmo, maior que a catedral de La Paz. Por fora nao me atraiu muito - é toda pintada de branco -, vamos ver depois como é por dentro. Lá fica a imagem de Nuestra Señora de Copacabana, padroeira da Bolívia. A crendice popular diz que é ela quem acalma o lago para que não inunde as plantações e, caso a imagem seja retirada do lugar, acontecerão enchentes catastróficas.
Durante o dia, faz um sol de rachar, mas a brisa do lago alivia um pouco o calor. E agora à noite, quando o sol já se pôs, bate um ventinho encanado que, rapaz do céu!, descobri que o que tem nas madrugadas de Curitiba é uma brisa morna.
Eu andei só um pouco às margens do lago, mas me encantei. É lindo. Em todos os lugares que já conheci, a água é que reflete o azul céu. Hoje descobri que o céu é um reflexo pálido do lago Titicaca.
* * *
E quer dizer que eu planejo tudo por meses, faço roteiros, junto dinheiro, junto coragem e embarco nessa aventura e vocês querem conhecer tudo de mão beijada, no conforto do lar?
Nada feito, nada de fotos. Quando voltar, eu vou organizar sessões de fotos e histórias na minha casa, a R$ 5,00 por pessoa. Estudante paga meia.
Peguei um taxi em La Paz para ir até a zona do cementerio, de onde saem os ônibus para esta região. O taxista era muito simpático e viemos toda a viagem trocando figurinhas sobre nossos países. No que desci do taxi, um motorista já me puxou e ofereceu passagem para Copacabana. É como eu já disse: aqui tudo se ganha no grito.
A viagem é muito bonita. A estrada passa ainda mais perto dos picos nevados e eu fiquei com mais vontade de ver a neve. Mas nada de llamas.
No meio do caminho, paramos para pegar uma cholita - já criei carinho por elas, falo no diminutivo. E adivinhem? Ela embarcou com quatro ovelhas. Quatro ovelhas! O motorista e o cobrador fizeram uma forca danada para colocar as bicinhas em cima da van, no rack de bagagens. Foram balindo de lá até aqui e uma senhora ficou gritando, horrorizada: "pobrecitas, pobrecitas!"
O caminho segue até que chegamos numa cidadezinha num estreito do lago, Tiquina. o povoado fica metade de um lado, metade do outro. Os ônibus e carros passam em balsas grandes, mas os passageiros passam separados, em lanchas. A senhora do "pobrecitas" veio histérica, gritando de medo e invocando a Virgen Maria de uma margem até a outra. E nesta hora tem que ser muito esperto: você tem que ficar de olho onde desembarca seu ônibus e correr atrás dele antes que vá embora e te largue lá. Os motoristas não parecem muito pacientes, não.
Numa das margens do estreito, um prédio imponente, sede da gloriosa Armada Mariña Boliviana. Coitados, a marinha deles não tem mar, que triste isso.
Ah, sim, o lago. É grande. Enorme. Se me dissessem que é mar, eu acreditaria. É todo rodeado de montanhas, agora sim verdinhas. As águas são calmas, quase paradas, dá pra ver as nuvens refletidas. É fácil entender porque o povo daqui ama tanto o Titicaca.
Copacabana é um cidade pequena, bem a beira do lago. É, bem dizer, a praia dos bolivianos. Eles se sentam na beira do lago, brincam com as com as crianças, tomam cerveja, tiram fotos e tudo o mais que se faz numa praia. Com a exceção que nao se entra na água. É muito gelada - inclusive todo mundo fica de blusa na praia - e o chão nao é de areia, mas de pedra. No máximo dá para molhar os pezinhos, mas o cabra tem que ser macho.
Existe um calçadão em volta do lago, com bancos para sentar. Nao é grande coisa, mas dá para o gasto. Também há pedalinhos, caiaques e bicicletas para alugar. Existem muitas montanhas ao redor, uma mais bonita que a outra. Na maior delas, o Cerro Calvario, se pode subir por uma trilha.
Pelo que vi, aqui é a cidade dos bicho-grilo bolivianos. Tem hippies na rua vendendo artesanato, que nem no Brasil. Inclusive são os mesmos brinquinhos, colarzinhos e estatuetas de duendes. Os gringos que vem para cá são também todos do mesmo estilo. Eu até soltei o cabelo para nao parecer muito engomadinho.
A cidade vive em torno da enorme basílica que existe aqui. Muito grande mesmo, maior que a catedral de La Paz. Por fora nao me atraiu muito - é toda pintada de branco -, vamos ver depois como é por dentro. Lá fica a imagem de Nuestra Señora de Copacabana, padroeira da Bolívia. A crendice popular diz que é ela quem acalma o lago para que não inunde as plantações e, caso a imagem seja retirada do lugar, acontecerão enchentes catastróficas.
Durante o dia, faz um sol de rachar, mas a brisa do lago alivia um pouco o calor. E agora à noite, quando o sol já se pôs, bate um ventinho encanado que, rapaz do céu!, descobri que o que tem nas madrugadas de Curitiba é uma brisa morna.
Eu andei só um pouco às margens do lago, mas me encantei. É lindo. Em todos os lugares que já conheci, a água é que reflete o azul céu. Hoje descobri que o céu é um reflexo pálido do lago Titicaca.
* * *
E quer dizer que eu planejo tudo por meses, faço roteiros, junto dinheiro, junto coragem e embarco nessa aventura e vocês querem conhecer tudo de mão beijada, no conforto do lar?
Nada feito, nada de fotos. Quando voltar, eu vou organizar sessões de fotos e histórias na minha casa, a R$ 5,00 por pessoa. Estudante paga meia.
Bolivia y Brasil
Embora o Brasil pouco ligue para a Bolívia, fique irritado com os caras do Vientosur tocando nas praças de Curitiba, e tenha preconceito com o povo daqui —inclusive com o presidente deles, por índio— não é esse sentimento que eu ando observando no outro lado da moeda.
Deve haver, claro, excessões, mas a verdade é que o povo boliviano admira o Brasil. Por sermos um país rico —e, olha, depois do que eu vi aqui, eu digo que somos riquíssimos—, por sermos los reys del fútbol, por termos grandes indústrias, por termos grandes e belas cidades, por termos água à vontade, por termos praias, por termos mulheres bonitas e por aí vai. A moça do hostal onde estou contou-me que seu sonho é conhecer as praias do Brasil, e que está juntando dinheiro para isso.
O presidente Lula é muito popular por aqui. No hostal me perguntaram se eu já o vi alguma vez. Admiram-no porque ele é o primeiro presidente que está mantendo maiores relações com a Bolívia. Acreditam que ele cedeu, sem relutar, a usina de gás em prol da soberania do povo boliviano —bom, aí cada um acredita no que quiser. São muitíssimo patriotas, nunca vi sentimento nacional tão forte. As pixações nas ruas aqui —muito poucas, aliás— são quase todas frases meio políticas, do tipo "viva Bolivia" ou "la unión es la fuerza", termo que está cunhado nas moedas. Os brasileiros bem podiam aprender isso.
Ouve-se muita música brasileira por aqui. Já topei com radinhos tocando desde Calypso —pensei que ia me livrar disso— a Pato Fu —o que foi uma ótima surpresa. E Roberto Carlos também é rei por aqui. Os bolivianos são loucos pelo Robertão.
Indústrias nao deve haver muitas aqui. Os carros são quase todos japoneses —Toyota, Honda, Mitsubishi, Suzuki— e muitos dos produtos industrializados vêm do Brasil. Chocolates, bolachas, produtos de higiene, até uma garrafinha de água que eu comprei. Tudo hecho en Brasil. Não sei se foi para puxar saco, mas a moça da farmácia me disse que são los mejores productos.
Engraçado é pensar que, enquanto os brasileiros viviam na idade da pedra, aqui já existiam civilizações avançaadas. Os tiwanakus, em 500 a.C já tinham um calendário anual solar com 365,24 dias —o que dá em ano bissexto. As tecnologias incas permitiam, 1000 anos atrás, extrair centenas de toneladas de alimento por hectare no solo árido, cerca de 30 vezes mais do que se consegue colher hoje. E o que tínhamos no Brasil? Nem escrita, nem cidades, nem plantações, nem nada. O povo boliviano já se organizava em revoluções populares já no século XVI, e nós aceitávamos submissos o jugo dos portugueses.
Enfim, voltarei ao Brasil olhando de outro modo para esse povo vizinho, mas tão ignorado. Isso porque eles enxergam o Brasil somente com olhos de admiração e amizade.
Deve haver, claro, excessões, mas a verdade é que o povo boliviano admira o Brasil. Por sermos um país rico —e, olha, depois do que eu vi aqui, eu digo que somos riquíssimos—, por sermos los reys del fútbol, por termos grandes indústrias, por termos grandes e belas cidades, por termos água à vontade, por termos praias, por termos mulheres bonitas e por aí vai. A moça do hostal onde estou contou-me que seu sonho é conhecer as praias do Brasil, e que está juntando dinheiro para isso.
O presidente Lula é muito popular por aqui. No hostal me perguntaram se eu já o vi alguma vez. Admiram-no porque ele é o primeiro presidente que está mantendo maiores relações com a Bolívia. Acreditam que ele cedeu, sem relutar, a usina de gás em prol da soberania do povo boliviano —bom, aí cada um acredita no que quiser. São muitíssimo patriotas, nunca vi sentimento nacional tão forte. As pixações nas ruas aqui —muito poucas, aliás— são quase todas frases meio políticas, do tipo "viva Bolivia" ou "la unión es la fuerza", termo que está cunhado nas moedas. Os brasileiros bem podiam aprender isso.
Ouve-se muita música brasileira por aqui. Já topei com radinhos tocando desde Calypso —pensei que ia me livrar disso— a Pato Fu —o que foi uma ótima surpresa. E Roberto Carlos também é rei por aqui. Os bolivianos são loucos pelo Robertão.
Indústrias nao deve haver muitas aqui. Os carros são quase todos japoneses —Toyota, Honda, Mitsubishi, Suzuki— e muitos dos produtos industrializados vêm do Brasil. Chocolates, bolachas, produtos de higiene, até uma garrafinha de água que eu comprei. Tudo hecho en Brasil. Não sei se foi para puxar saco, mas a moça da farmácia me disse que são los mejores productos.
Engraçado é pensar que, enquanto os brasileiros viviam na idade da pedra, aqui já existiam civilizações avançaadas. Os tiwanakus, em 500 a.C já tinham um calendário anual solar com 365,24 dias —o que dá em ano bissexto. As tecnologias incas permitiam, 1000 anos atrás, extrair centenas de toneladas de alimento por hectare no solo árido, cerca de 30 vezes mais do que se consegue colher hoje. E o que tínhamos no Brasil? Nem escrita, nem cidades, nem plantações, nem nada. O povo boliviano já se organizava em revoluções populares já no século XVI, e nós aceitávamos submissos o jugo dos portugueses.
Enfim, voltarei ao Brasil olhando de outro modo para esse povo vizinho, mas tão ignorado. Isso porque eles enxergam o Brasil somente com olhos de admiração e amizade.
9.2.07
Tiwanaku
Hoje foi o dia mais legal. Vamos por partes que vai ficar comprido...
Acordei cedo para ir a Tiwanaku. É uma cidadela de uma civilização que existiu antes dos incas. Tomei um belo café —inclusive aprendi um ditado daqui: desayuna como un rey, almuerza como un principe e cena como um mendigo— e peguei um táxi para ir até onde saem os onibus para lá. Que contratar excursao de gringo, que nada, eu vou direto no quente!
A viagem é curta: 75 km. Fui com um grupo de argentinos, que foram o tempo todo tomando tererê, um peruano, que foi o tempo todo lendo Sartre e mais uns bolivianos, gente boníssima. La Paz fica literalmente dentro de um buraco, para sair é fácil: você sobe, sobe, sobe e sobe mais. Quando chega lá em cima —uma cidade chamada El Alto— dá para ver a cidade inteira lá em baixo, visão panorâmica. E daí você sobe um pouco mais.
Depois o ônibus pega uma reta sem fim numa planura só. Vi algumas vilas, umas vacas magras, ovelhas e até burros, mas nada de lhamas. Nao há pássaros aqui, é tudo muito árido. Rios eu vi só dois, e são mais barro que água, impossível de beber.
Ao fundo, se vê várias montanhas e, para minha surpresa, a Cordillera Real, com seus picos nevados. São lindas, iguais as montanhas dos filmes. Ok, foi de longe, mas eu vi a neve pela primeira vez. E decidi minhas próximas férias: vou para algum lugar com neve, nem que vá sozinho de novo!
Chegamos lá, comprei o bilhete, meio carinho: 10 dólares. Entrei sozinho no museu, que os argentinos eram muito chatos, e não quis contratar guia. Há muitas peçaas de pedra tiradas das escavações, algumas com 4000 anos de idade! Fui seguindo atrás de um grupo de 4 pessoas, lideradas pelo Gandalf, só que de macacao jeans. Tirei várias fotos, bem na boa, até que veio um guarda me avisar que era proibido. O Gandalf me olhou meio de lado, mas não foi maldade, juro que não sabia.
Depois saí e segui, discretamente, o grupo do Gandalf para ver onde se entrava no sítio arqueológico. Não tenho como descrever. É impressionante pensar que enquanto eles construíam essas maravilhas, não existia nem Brasil ainda. E, enquanto eu fazia minhas conjecturas, uma nuvem preta vinha chegando mais perto.
A cidade é composta de três partes: a cidadela, em honra ao deus do mundo terrestre; um templo subterrâneo, para o deus do mundo inferior; e uma pirâmide, para o deus celeste. A pirâmide ainda não foi encontrada, mas eles estao escavando um morro que tem ao lado, deve estar ali. O lugar inteiro foi descoberto recentemente, na década de 1970, então ainda está em obras arqueológicas. E a nuvem chegando.
Olhei tudo, tirei fotos e subi o morro. Sempre de olho no Gandalf, para não me perder. A vista é impressionante. Lá em cima encontrei um guarda e perdi a vergonha: pedi que tirasse uma foto minha. De quebra, ainda ganhei várias explicações. E de graca!, que quem é simpático nao precisa pagar guia. E a nuvem chegando.
Foi o tempo de eu descer o morro e começou a chover. Granizo! Saí correndo para me abrigar no museu e então eu vi! Meninos, eu vi!
A coisa de uns 3 metros de mim, passou uma lhama. ¡Una llama! Fiquei parado lá, feito bobo olhando o bicho, pêlo branquinho, macio, maior que eu imaginava. Sem exagero, vivi um momento de pura alegria enquanto o granizo me machucava o rosto. Só nao saquei a câmera porque lembrei que ainda tem muitas prestações para pagar, e chuva com pedras de gelo do tamanho de uma moeda de um real nao devem ser uma boa para dispositivos digitais. Mas nisso perdi o Gandalf de vista. Uma pena, estava quase virando amigo do velhinho. Um sarro: barbudo, com um cajado,uma bolsinha colorida do lado e macacão jeans!
Pulei numa van para voltar para La Paz e, em seguida, entrou uma mulher com duas crianças. Falando português! Puxei papo: ela é boliviana, mora em Sao Paulo há 15 anos e agora veio para mostrar sua terra natal para os filhos.
Quando descemos, perdi mais um pouco da vergonha e pedi para rachar o táxi até o centro com duas argentinas que vieram junto. Fiz economia e duas amigas. Ficamos na plaza Murillo, meio longe para mim, mas tudo bem porque tiva uma bela surpresa: a porta da catedral estava aberta. Ontem tirei fotos só de fora, porque estava fechada e fiquei chateado por não poder entrar.
"Meu Deus do Céu" foi só o que pude pensar lá dentro. É linda, enorme, imponente como nenhuma igreja que já vi na vida, talvez só a Sé. Põe a catedralzinha da praçaa Tiradentes no bolso. E no bolso pequeno, das moedas.
No altar-mor, uma senhora rezava o terço no microfone. Quando terminou, perdi mais um pouco da vergonha e fui lá puxar papo. Ela ficou emocionada quando soube que eu era lider de un grupo de jóvenes en Brasil e sempre faço propaganda para que rezem o terço. Ficamos amigos, e ganhei o folhetinho do qual ela estava lendo os mistérios.
Enfim, vi a neve, vi uma lhama, conheci uma cultura de 4.000 anos, aprendi a rezar em espanhol e fiz vários amigos. Nada mal para um dia de férias.
Acordei cedo para ir a Tiwanaku. É uma cidadela de uma civilização que existiu antes dos incas. Tomei um belo café —inclusive aprendi um ditado daqui: desayuna como un rey, almuerza como un principe e cena como um mendigo— e peguei um táxi para ir até onde saem os onibus para lá. Que contratar excursao de gringo, que nada, eu vou direto no quente!
A viagem é curta: 75 km. Fui com um grupo de argentinos, que foram o tempo todo tomando tererê, um peruano, que foi o tempo todo lendo Sartre e mais uns bolivianos, gente boníssima. La Paz fica literalmente dentro de um buraco, para sair é fácil: você sobe, sobe, sobe e sobe mais. Quando chega lá em cima —uma cidade chamada El Alto— dá para ver a cidade inteira lá em baixo, visão panorâmica. E daí você sobe um pouco mais.
Depois o ônibus pega uma reta sem fim numa planura só. Vi algumas vilas, umas vacas magras, ovelhas e até burros, mas nada de lhamas. Nao há pássaros aqui, é tudo muito árido. Rios eu vi só dois, e são mais barro que água, impossível de beber.
Ao fundo, se vê várias montanhas e, para minha surpresa, a Cordillera Real, com seus picos nevados. São lindas, iguais as montanhas dos filmes. Ok, foi de longe, mas eu vi a neve pela primeira vez. E decidi minhas próximas férias: vou para algum lugar com neve, nem que vá sozinho de novo!
Chegamos lá, comprei o bilhete, meio carinho: 10 dólares. Entrei sozinho no museu, que os argentinos eram muito chatos, e não quis contratar guia. Há muitas peçaas de pedra tiradas das escavações, algumas com 4000 anos de idade! Fui seguindo atrás de um grupo de 4 pessoas, lideradas pelo Gandalf, só que de macacao jeans. Tirei várias fotos, bem na boa, até que veio um guarda me avisar que era proibido. O Gandalf me olhou meio de lado, mas não foi maldade, juro que não sabia.
Depois saí e segui, discretamente, o grupo do Gandalf para ver onde se entrava no sítio arqueológico. Não tenho como descrever. É impressionante pensar que enquanto eles construíam essas maravilhas, não existia nem Brasil ainda. E, enquanto eu fazia minhas conjecturas, uma nuvem preta vinha chegando mais perto.
A cidade é composta de três partes: a cidadela, em honra ao deus do mundo terrestre; um templo subterrâneo, para o deus do mundo inferior; e uma pirâmide, para o deus celeste. A pirâmide ainda não foi encontrada, mas eles estao escavando um morro que tem ao lado, deve estar ali. O lugar inteiro foi descoberto recentemente, na década de 1970, então ainda está em obras arqueológicas. E a nuvem chegando.
Olhei tudo, tirei fotos e subi o morro. Sempre de olho no Gandalf, para não me perder. A vista é impressionante. Lá em cima encontrei um guarda e perdi a vergonha: pedi que tirasse uma foto minha. De quebra, ainda ganhei várias explicações. E de graca!, que quem é simpático nao precisa pagar guia. E a nuvem chegando.
Foi o tempo de eu descer o morro e começou a chover. Granizo! Saí correndo para me abrigar no museu e então eu vi! Meninos, eu vi!
A coisa de uns 3 metros de mim, passou uma lhama. ¡Una llama! Fiquei parado lá, feito bobo olhando o bicho, pêlo branquinho, macio, maior que eu imaginava. Sem exagero, vivi um momento de pura alegria enquanto o granizo me machucava o rosto. Só nao saquei a câmera porque lembrei que ainda tem muitas prestações para pagar, e chuva com pedras de gelo do tamanho de uma moeda de um real nao devem ser uma boa para dispositivos digitais. Mas nisso perdi o Gandalf de vista. Uma pena, estava quase virando amigo do velhinho. Um sarro: barbudo, com um cajado,uma bolsinha colorida do lado e macacão jeans!
Pulei numa van para voltar para La Paz e, em seguida, entrou uma mulher com duas crianças. Falando português! Puxei papo: ela é boliviana, mora em Sao Paulo há 15 anos e agora veio para mostrar sua terra natal para os filhos.
Quando descemos, perdi mais um pouco da vergonha e pedi para rachar o táxi até o centro com duas argentinas que vieram junto. Fiz economia e duas amigas. Ficamos na plaza Murillo, meio longe para mim, mas tudo bem porque tiva uma bela surpresa: a porta da catedral estava aberta. Ontem tirei fotos só de fora, porque estava fechada e fiquei chateado por não poder entrar.
"Meu Deus do Céu" foi só o que pude pensar lá dentro. É linda, enorme, imponente como nenhuma igreja que já vi na vida, talvez só a Sé. Põe a catedralzinha da praçaa Tiradentes no bolso. E no bolso pequeno, das moedas.
No altar-mor, uma senhora rezava o terço no microfone. Quando terminou, perdi mais um pouco da vergonha e fui lá puxar papo. Ela ficou emocionada quando soube que eu era lider de un grupo de jóvenes en Brasil e sempre faço propaganda para que rezem o terço. Ficamos amigos, e ganhei o folhetinho do qual ela estava lendo os mistérios.
Enfim, vi a neve, vi uma lhama, conheci uma cultura de 4.000 anos, aprendi a rezar em espanhol e fiz vários amigos. Nada mal para um dia de férias.
Post pessoal
Ok, estou a 4000 metros de altitude, num país estranho, numa hora diferente da que meu corpo estava acostumado, falando uma língua que nao domino lá muito bem e lidando com um dinheiro do qual nao tenho muita nocao. E - onde o bicho mais pega - sozinho de tudo. Nem tudo é tao lindo assim, claro.
Altitude nao foi problema para mim. Nao tive, como diziam, dor de cabeca, nem meu nariz sangrou e nem ao menos me senti cansado. Só no primeiro dia em Cocha fiquei meio sem fome, mas acho que pode até ser por causa do fuso horário. Quem em conhece, sabe que eu sou muito regrado - chato mesmo - com isso: passou da minha horinha de comer, nao como mais.
Com o novo fuso horário eu estou quase acostumado. Afinal nao é tanta diferenca assim - 2 horas a menos. Só me deito meio cedo, lá pelas 22h00. Mesmo porque nao tem muito o que fazer depois disso.
Comida é meio comlicado. Eu ainda nao conheci tudo o que eles tem aqui, entao vou ficando no cardápio mais brasleiro. Aos poucos me aventuro e vou provando as coisas que eles tem aqui. Tudo muito bom, mas ainda falta aquele toquinho brasileiro...
Ainda nao tive problemas com roupas. As minhas dao para o gasto. Aqui em La Paz é meio friozinho, mas lembra muito o clima de Curitiba. nada a que eu nao esteja acostumado. Só estou repetindo as roupas mais que o habitual, afinal nao tem mamae para lavar minhas coisas aqui. (Ai, que vontade de falar com a minha mae...)
Cuecas. Trouxe poucas para muitos dias. Como fazer? Eu as lavo no chuveiro, quando tomo banho. Ficam bem cheirosas com sabonete.
Hoje me barbeei pela primeira vez desde que saí de casa, em Curitiba, no sábado a noite. Sem espuma, tive que resgatar uma técnica que há muito tempo nao usava: barbear-me com sabonete.
Lembrei-me do capitao Pascarella, que ensinou no CFR que quando o combatente está de moral baixa, a melhor coisa é uma penteada no cabelo. Hoje, antes de sair, tomei um banho quente, fiz a barba, me perfumei, penteei e prendi os cabelos com cuidado e me senti novo em folha. Moral do combantente lá em cima! Aliás, muito do que aprendi no CFR está sendo relembrado aqui. Bons tempos, viu?
Espanhol nao é muito difícil. Eu tenho o vocabuláro até que bem abrangente, mas em algumas situacoes o bicho pega. Aí o negócio é apontar para o que ser quer, uma linguagem universal. O engracado é que nao adianta falar portugues, eles nao entendem em uma palavra.
Bolivianos. Demorei um pouco para chegar num cambio legal, e cheguei a conclusao que um boliviano vale 25 centavos de real. Arredondando, claro. A conta mais certa é com o dólar: uma verdinha dá exatamente 8 bolivianos. Alguns deles aqui chamam a moeda de peso, nao sei por que raios.
Estar sozinho é complicado as vezes. Nao encontrei nenhum brasileiro até agora e sinto falta de falar um pouco de portugues. Sinto falta de conversar também, seja lá em que língua for. mas quanto a isso já estou ficando mais atrevido, vencendo minha timidez e puxando papo com os turistas. As vezes eu invento assunto para puxar papo. eu até sei onde ficam as coisas, mas pergunto no hotel como se faz para chegar, só para conversar um pouquinho.
A verdade é que eu nao pensei que fosse me sentir tao sozinho. Ontem mesmo eu me senti meio triste, a noitinha. Comecei a ficar com medo de que desse algo errado, que me roubassem o dinheiro ou sei lá que diabos me acontecesse. Mas logo passou. Quando estou na rua, eu me sinto feliz, forte, livre como nunca na vida.
Cheguei a conclusao de que nao é legal ficar muito tempo de bobeira no hotel. O negócio é estar no meio das pessoas. Quando estou na rua, eu estou sempre feliz. Em alguns momentos me emociono pensando em tudo o que de bom está acontecendo comigo nesta viagem.
Enfim, nada que eu nao possa vencer. Estou conhecendo melhor a mim mesmo, superando e ampliando meus medos, minhas limitacoes. E se antes eu já me considerava um homem forte, firme, quando terminar esta jornada, sei que nada mais no mundo vai me derrubar fácil. Porque medo todo mundo tem, e cabe a cada um a decisao de enfrentá-los ou render-se a eles. Coragem a gente forja um pouco mais a cada dia.
* * *
Ah, sim! Estou frustrado: nao vi NENHUMA lhama até agora. Digo, nenhuma lhama viva. Porque no mercado aqui tem uns fetos de lhama secos, umas belezinhas. Posso levar para quem encomendar.
Altitude nao foi problema para mim. Nao tive, como diziam, dor de cabeca, nem meu nariz sangrou e nem ao menos me senti cansado. Só no primeiro dia em Cocha fiquei meio sem fome, mas acho que pode até ser por causa do fuso horário. Quem em conhece, sabe que eu sou muito regrado - chato mesmo - com isso: passou da minha horinha de comer, nao como mais.
Com o novo fuso horário eu estou quase acostumado. Afinal nao é tanta diferenca assim - 2 horas a menos. Só me deito meio cedo, lá pelas 22h00. Mesmo porque nao tem muito o que fazer depois disso.
Comida é meio comlicado. Eu ainda nao conheci tudo o que eles tem aqui, entao vou ficando no cardápio mais brasleiro. Aos poucos me aventuro e vou provando as coisas que eles tem aqui. Tudo muito bom, mas ainda falta aquele toquinho brasileiro...
Ainda nao tive problemas com roupas. As minhas dao para o gasto. Aqui em La Paz é meio friozinho, mas lembra muito o clima de Curitiba. nada a que eu nao esteja acostumado. Só estou repetindo as roupas mais que o habitual, afinal nao tem mamae para lavar minhas coisas aqui. (Ai, que vontade de falar com a minha mae...)
Cuecas. Trouxe poucas para muitos dias. Como fazer? Eu as lavo no chuveiro, quando tomo banho. Ficam bem cheirosas com sabonete.
Hoje me barbeei pela primeira vez desde que saí de casa, em Curitiba, no sábado a noite. Sem espuma, tive que resgatar uma técnica que há muito tempo nao usava: barbear-me com sabonete.
Lembrei-me do capitao Pascarella, que ensinou no CFR que quando o combatente está de moral baixa, a melhor coisa é uma penteada no cabelo. Hoje, antes de sair, tomei um banho quente, fiz a barba, me perfumei, penteei e prendi os cabelos com cuidado e me senti novo em folha. Moral do combantente lá em cima! Aliás, muito do que aprendi no CFR está sendo relembrado aqui. Bons tempos, viu?
Espanhol nao é muito difícil. Eu tenho o vocabuláro até que bem abrangente, mas em algumas situacoes o bicho pega. Aí o negócio é apontar para o que ser quer, uma linguagem universal. O engracado é que nao adianta falar portugues, eles nao entendem em uma palavra.
Bolivianos. Demorei um pouco para chegar num cambio legal, e cheguei a conclusao que um boliviano vale 25 centavos de real. Arredondando, claro. A conta mais certa é com o dólar: uma verdinha dá exatamente 8 bolivianos. Alguns deles aqui chamam a moeda de peso, nao sei por que raios.
Estar sozinho é complicado as vezes. Nao encontrei nenhum brasileiro até agora e sinto falta de falar um pouco de portugues. Sinto falta de conversar também, seja lá em que língua for. mas quanto a isso já estou ficando mais atrevido, vencendo minha timidez e puxando papo com os turistas. As vezes eu invento assunto para puxar papo. eu até sei onde ficam as coisas, mas pergunto no hotel como se faz para chegar, só para conversar um pouquinho.
A verdade é que eu nao pensei que fosse me sentir tao sozinho. Ontem mesmo eu me senti meio triste, a noitinha. Comecei a ficar com medo de que desse algo errado, que me roubassem o dinheiro ou sei lá que diabos me acontecesse. Mas logo passou. Quando estou na rua, eu me sinto feliz, forte, livre como nunca na vida.
Cheguei a conclusao de que nao é legal ficar muito tempo de bobeira no hotel. O negócio é estar no meio das pessoas. Quando estou na rua, eu estou sempre feliz. Em alguns momentos me emociono pensando em tudo o que de bom está acontecendo comigo nesta viagem.
Enfim, nada que eu nao possa vencer. Estou conhecendo melhor a mim mesmo, superando e ampliando meus medos, minhas limitacoes. E se antes eu já me considerava um homem forte, firme, quando terminar esta jornada, sei que nada mais no mundo vai me derrubar fácil. Porque medo todo mundo tem, e cabe a cada um a decisao de enfrentá-los ou render-se a eles. Coragem a gente forja um pouco mais a cada dia.
* * *
Ah, sim! Estou frustrado: nao vi NENHUMA lhama até agora. Digo, nenhuma lhama viva. Porque no mercado aqui tem uns fetos de lhama secos, umas belezinhas. Posso levar para quem encomendar.
8.2.07
La Paz
Para ser sincero, La Paz não tem muito de paz, não. A cidade é, como dizer?... vibrante. Buzinas, vendedores, ônibus barulhentos, apitos de guardas e gritos dos cobradores de van. Tudo aqui é na base do grito. "Cementerio, helatinas, Fátima, plaza Murillo, um boliviano, choclo, choclo!"
Acordei hoje meio tarde - 8h00 - e saí para tomar café. Descobri que aqui no café onde eu já virei freguês eles têm buffet pela manhã. Aí, sim, tirei a barriga da miséria: leite, iogurte, cereais, frutas, pão e chá - de coca, claro. Cá entre nós, como as frutas do Brasil não tem igual, mas quebra-se um galho. As deles são meio aguadas, parece. E o abacaxi é azeeedo...
Andei pela avenida Mariscal Santa Cruz, a principal daqui. É muito bonita, muito agradável. Bem larga, com um canteiro central no meio. Um canteiro que mais parece um parque - eles chamam de prado -, com bancos, jardins e vários monumentos. Vi de tudo, de Burger King a escritório da Varig e um Banco do Brasil.
Na hora do almoço, voltei para o hostal e decidi me mandar de lá. Nao estava me sentindo bem. Consegui vaga no que eu queria - onde não tinha lugar ontem. Quarto maior, suíte, mais limpo, mais claro e - fiquei feliz da vida - mais barato.
Decidi almoçar com classe. Entrei no restaurante mais caro que encontrei no guia - abençoado guia que eu decidi comprar no Brasil - e pedi um menu completo, com salada, entrada e prato principal. E não pensei duas vezes, para segundo, como eles dizem, pedi um belo bife de lhama! Olha, cá entre nós de novo, não tem nada de especial. Falando de textura, parece um bife duro. O gosto é até que bom, bem suave, e lembra um pouco fígado. Acho que sou mais uma boa picanha bem suculenta.
Logo quando saía do restaurante, entrou um rapaz com uma camiseta da bandeira do Brasil, acompanhado de uma menina. Corri atrás, feliz da vida, e perguntei se eram brasileiros. Nada. Não falavam nem espanhol, quem dirá o bom e velho português. Deviam proibir esses gringos de usar nossa bandeira, eles que usem as bandeiras feias e sem cor deles.
Depois, andei mais pela Mariscal - gostei da avenida - e fui até a Plaza Murillo, o centro político da Bolívia, quintal da casa do presidente Evo. Muito legal lá. O pessoal todo sentado nos bancos ou nas escadas, bem na boa, tomando sorvete, conversando com os guardas - guardas armados de metralhadora, bomba de gás e escudo - ou dando de comer para os pombos. E quantos pombos! Na plaza, não precisa ser lá muito esperto para notar que sao três os prédios importantes: o Palácio Quemado, casa do meu amigo Evo, o Palácio Legislativo, muito bonito, e a catedral, enorme, demorou 150 anos para ficar pronta. O presidente não deu o ar da graça, infelizmente, mas eu tirei fotos da janela dele.
Ainda no centro, vi a prefeitura de La Paz, um predinho meio europeu, e várias igrejas. Aqui tem uma em cada esquina, e uma mais linda que a outra. Também a cada um quarteirão que se anda, você encontra policiais, com seus uniformes verdinhos. Aqui só tem a Polizia Nacional, que faz tudo, desde cuidar do trânsito até guardar as portas dos bancos. E é incrível como são amistosos, bem diferentes dos nossos PMs.
Na volta, fiquei notando como eles aqui são exatamente iguais aos brasileiros. Gente como todo mundo, sabe? Vi roqueiros, hippies, rappers, cabeludos, emos, criancas de uniforme escolar - um charme os uniformes deles, de sainha e gravatinha - e até o pessoal da maromba com seus pit bulls. Um grupinho de estudantes brincava de jogar bexigas de água nas meninas. Parecia divertido. A vida aqui, aliás, parece divertida, despreocupada.
Um parágrafo à parte merecem os americanos. Hay muchos aqui, e eles não têm vergonha nenhuma de serem ridículos. Vi uma menina com um colete salva-vida laranja - detalhe que a Bolívia nem tem mar -, altos gringos bicho-grilo, um rapaz de pantalonas amarelas com bolinhas roxas e um tiozinho de conjunto safári completo - chapeuzinho, colete de pescador, bermudinha, sapato e meias esticadas até as canelas. É como diz o seu Zé Mauro: "dá trabalho criar um bobo, mas depois de criado, dá gosto!"
Já noitinha, encontrei um grupo que me pareceu de japoneses. Como tem uns bolivianos de olhos puxados que enganam a gente, andei bem devagar para escutá-los. Eram japoneses! Não resisti e tasquei meu nihongo neles. Tinha que ver a felicidade deles. E eu saí mais feliz ainda, por ter conseguido conversar uns dez minutos em japonês, com japoneses de verdade. A Miyoko sensei vai ficar tão feliz quando eu contar...
* * *
Hoje comprei láminas para afeitarme. Entrei numa farmácia e encontrei as mesmas que eu uso no Brasil: Gillete Sensor Excel descartável - olha a propaganda. Importadas daí do Brasil. Hecho en Brasil, como se dise aqui.
No Brasil, um pacote com 4 não sai por menos de R$ 6,00. Adivinhem quanto eu paguei? 8 bolivianos, menos de R$ 2,10. As mesmíssimas giletes. Viver no país dos impostos é fogo. Quando voltar, vou virar traficante de produtos de higiene pessoal e ficar milionário.
Acordei hoje meio tarde - 8h00 - e saí para tomar café. Descobri que aqui no café onde eu já virei freguês eles têm buffet pela manhã. Aí, sim, tirei a barriga da miséria: leite, iogurte, cereais, frutas, pão e chá - de coca, claro. Cá entre nós, como as frutas do Brasil não tem igual, mas quebra-se um galho. As deles são meio aguadas, parece. E o abacaxi é azeeedo...
Andei pela avenida Mariscal Santa Cruz, a principal daqui. É muito bonita, muito agradável. Bem larga, com um canteiro central no meio. Um canteiro que mais parece um parque - eles chamam de prado -, com bancos, jardins e vários monumentos. Vi de tudo, de Burger King a escritório da Varig e um Banco do Brasil.
Na hora do almoço, voltei para o hostal e decidi me mandar de lá. Nao estava me sentindo bem. Consegui vaga no que eu queria - onde não tinha lugar ontem. Quarto maior, suíte, mais limpo, mais claro e - fiquei feliz da vida - mais barato.
Decidi almoçar com classe. Entrei no restaurante mais caro que encontrei no guia - abençoado guia que eu decidi comprar no Brasil - e pedi um menu completo, com salada, entrada e prato principal. E não pensei duas vezes, para segundo, como eles dizem, pedi um belo bife de lhama! Olha, cá entre nós de novo, não tem nada de especial. Falando de textura, parece um bife duro. O gosto é até que bom, bem suave, e lembra um pouco fígado. Acho que sou mais uma boa picanha bem suculenta.
Logo quando saía do restaurante, entrou um rapaz com uma camiseta da bandeira do Brasil, acompanhado de uma menina. Corri atrás, feliz da vida, e perguntei se eram brasileiros. Nada. Não falavam nem espanhol, quem dirá o bom e velho português. Deviam proibir esses gringos de usar nossa bandeira, eles que usem as bandeiras feias e sem cor deles.
Depois, andei mais pela Mariscal - gostei da avenida - e fui até a Plaza Murillo, o centro político da Bolívia, quintal da casa do presidente Evo. Muito legal lá. O pessoal todo sentado nos bancos ou nas escadas, bem na boa, tomando sorvete, conversando com os guardas - guardas armados de metralhadora, bomba de gás e escudo - ou dando de comer para os pombos. E quantos pombos! Na plaza, não precisa ser lá muito esperto para notar que sao três os prédios importantes: o Palácio Quemado, casa do meu amigo Evo, o Palácio Legislativo, muito bonito, e a catedral, enorme, demorou 150 anos para ficar pronta. O presidente não deu o ar da graça, infelizmente, mas eu tirei fotos da janela dele.
Ainda no centro, vi a prefeitura de La Paz, um predinho meio europeu, e várias igrejas. Aqui tem uma em cada esquina, e uma mais linda que a outra. Também a cada um quarteirão que se anda, você encontra policiais, com seus uniformes verdinhos. Aqui só tem a Polizia Nacional, que faz tudo, desde cuidar do trânsito até guardar as portas dos bancos. E é incrível como são amistosos, bem diferentes dos nossos PMs.
Na volta, fiquei notando como eles aqui são exatamente iguais aos brasileiros. Gente como todo mundo, sabe? Vi roqueiros, hippies, rappers, cabeludos, emos, criancas de uniforme escolar - um charme os uniformes deles, de sainha e gravatinha - e até o pessoal da maromba com seus pit bulls. Um grupinho de estudantes brincava de jogar bexigas de água nas meninas. Parecia divertido. A vida aqui, aliás, parece divertida, despreocupada.
Um parágrafo à parte merecem os americanos. Hay muchos aqui, e eles não têm vergonha nenhuma de serem ridículos. Vi uma menina com um colete salva-vida laranja - detalhe que a Bolívia nem tem mar -, altos gringos bicho-grilo, um rapaz de pantalonas amarelas com bolinhas roxas e um tiozinho de conjunto safári completo - chapeuzinho, colete de pescador, bermudinha, sapato e meias esticadas até as canelas. É como diz o seu Zé Mauro: "dá trabalho criar um bobo, mas depois de criado, dá gosto!"
Já noitinha, encontrei um grupo que me pareceu de japoneses. Como tem uns bolivianos de olhos puxados que enganam a gente, andei bem devagar para escutá-los. Eram japoneses! Não resisti e tasquei meu nihongo neles. Tinha que ver a felicidade deles. E eu saí mais feliz ainda, por ter conseguido conversar uns dez minutos em japonês, com japoneses de verdade. A Miyoko sensei vai ficar tão feliz quando eu contar...
* * *
Hoje comprei láminas para afeitarme. Entrei numa farmácia e encontrei as mesmas que eu uso no Brasil: Gillete Sensor Excel descartável - olha a propaganda. Importadas daí do Brasil. Hecho en Brasil, como se dise aqui.
No Brasil, um pacote com 4 não sai por menos de R$ 6,00. Adivinhem quanto eu paguei? 8 bolivianos, menos de R$ 2,10. As mesmíssimas giletes. Viver no país dos impostos é fogo. Quando voltar, vou virar traficante de produtos de higiene pessoal e ficar milionário.
Cocha - La Paz
A viagem de Cocha para la Paz merece um post exclusivo. Bela aventura.
Na rodoviária, dezenas de adolescentes barulhentos ficam tentando pescar clientes para a companhia deles. Gritam todos sem parar e ao mesmo tempo. "La Paz, La Paz, Sucre, Potosí, La Paz..."
Seguindo meus instintos, fui direto ao guichê da companhia que me pareceu mais legal. O Expreso El Dorado.
Embarquei às 9h30 e admito que fiquei aliviado porque quem sentou ao meu lado não foi uma chola, mas uma vovozinha simpática. Educada, limpa e coisa e tal. Gente normal, na minha concepção meio preconceituosa.
Antes de sair, entram pessoas no ônibus para vender coisas. Igualzinho nos filmes. É choclo para cá, pollo para lá - imaginem frango dentro do onibus! - e mais umas coisas que não consegui entender, todas muito coloridas. Fiquei impressionado com a solidariedade das pessoas quando entrou um cego pedindo esmolas. Todas as pessoas, até mesmo as cholas mais pobres, lhe deram uma moeda. Logo depois, entrou um rapazinho simpático, dsempregado, que canta para ganhar a vida. Dei a ele cinco bolivianos só porque cantou uma do Rei Roberto. En español, claro. "Usted es mi amigo de fe..."
A viagem é bem monótona. O ônibus vai serpenteando entre as montanhas, é curva que não acaba mais. Tudo muito marrom, senti falta do nosso verde brasileiro. E dá-lhe subida, parece que a gente vai chegar no céu. E muita gente parece que chega: ao longo da estrada, tem muitas cruzes, mas muitas mesmo. Estrada perigosa, carros velhos e motoristas bolivianos não parece ser uma combinação lá muito boa.
Todas as vezes que o ônibus pára, seja para embarcarem passageiros ou pagar pedágio, dezenas de mulheres correm - correm literalmente - para vender comida. E vendem de tudo que se possa imaginar, sempre, claro, gritando sem parar, ao mesmo tempo e desesperadamente. Reparei que o choclo é um preferido por aqui.
Paramos para o almoço no lugar mais imundo que eu já vi na minha vida. E fedido - e olha que aqui eu já vi muita sujeira, viu? Desci mais para esticar as pernas mesmo. Não tinha nada industrializado, no pacotinho fechado e não tive coragem de pedir nada. Fiquei meio decepcionado comigo mesmo. Entrei de novo no ônibus e a senhorinha tirou duas maçãs da bolsa. Na hora eu pensei: "meu Deus, como iria bem uma frutinha agora". E então ela me ofereceu uma! Eu fiquei tão feliz que até exagerei no agradecimento:
- Muchisimas gracias, señora. Díos la bendiga!
Todos de barriga cheia, saímos e o motorista colocou na TV, então, um filme mexicano sobre um padre. Chato. Dormi.
Na beira da estrada, passamos por várias vilas e fiquei triste com o que vi. Umas casinhas que fariam qualquer barraco de favela brasileira parecer um palácio. Nunca vi tanta pobreza na minha vida. Miséria absoluta mesmo.
Chegando em La Paz, o episódio mais engraçado até agora - mas que bem poderia ter sido triste. O ônibus vinha a milhào por hora, e, numa curva, apareceu um caminhão atravessado na pista, saindo de uma obra. Bela freada! E adivinhem? Nosso motorista desceu na hora, abriu a porta do caminhào, puxou o sujeito para fora e sentou-lhe a porrada! Dois belos diretos de direita. Ficamos parados, todos os passageiros na janela xingando o pobre - inclusive minha amiga vovozinha -, até que chegou a polícia. E dá-lhe carajo e putamierda!
Chegamos com chuva em la Paz e eu já pulei dentro de um táxi. O trânsito estava uma mierda, com o perdão da palavra. Devia estar acontecendo alguma coisa no centro, porque várias ruas estavam fechadas e ouvia-se tiros de canhão e gritos do povo. Quem sabe um pronunciamento do presidente Evo e eu perdi?
O hostal que eu tinha escolhido - aleatoriamente - no guia não tinha quartos. Uma pena porque era muito bonito. Acabei ficando num outro perto. Meio moquifo, quando entrei me bateu até uma tristeza.
Saí para jantar na calle Sagárnaga, carinhosamente chamada pelos paceños de "alameda dos gringos". Entrei num café muito bonito e pedi o famoso mate de coca e um belo sanduíche para matar a fome acumulada da viagem. Decepção: o chá tem gosto de mato, nada diferente do chá verde. Tomei só de curiosidade mesmo, porque - fiquei muito feliz com isso - não senti efeito nenhum do soroche. Subi umas ladeiras enormes com a mochila - pesada em 15,4 kg no aeroporto - nas costas e nada. Estou inteirão!
Voltei para o hostal e ouvi gente falando inglês na cozinha. Corri para ver. Eram quatro americanas simpáticas. Uma delas morou um ano em Campinas e outra, meio coroa, dez anos na Argentina. Conversamos um pouco, trocamos figurinhas, eu fiz um chá de coca e fui deitar. E no cansaço que estava, o quarto nem me pareceu mais tão mal assim.
Na rodoviária, dezenas de adolescentes barulhentos ficam tentando pescar clientes para a companhia deles. Gritam todos sem parar e ao mesmo tempo. "La Paz, La Paz, Sucre, Potosí, La Paz..."
Seguindo meus instintos, fui direto ao guichê da companhia que me pareceu mais legal. O Expreso El Dorado.
Embarquei às 9h30 e admito que fiquei aliviado porque quem sentou ao meu lado não foi uma chola, mas uma vovozinha simpática. Educada, limpa e coisa e tal. Gente normal, na minha concepção meio preconceituosa.
Antes de sair, entram pessoas no ônibus para vender coisas. Igualzinho nos filmes. É choclo para cá, pollo para lá - imaginem frango dentro do onibus! - e mais umas coisas que não consegui entender, todas muito coloridas. Fiquei impressionado com a solidariedade das pessoas quando entrou um cego pedindo esmolas. Todas as pessoas, até mesmo as cholas mais pobres, lhe deram uma moeda. Logo depois, entrou um rapazinho simpático, dsempregado, que canta para ganhar a vida. Dei a ele cinco bolivianos só porque cantou uma do Rei Roberto. En español, claro. "Usted es mi amigo de fe..."
A viagem é bem monótona. O ônibus vai serpenteando entre as montanhas, é curva que não acaba mais. Tudo muito marrom, senti falta do nosso verde brasileiro. E dá-lhe subida, parece que a gente vai chegar no céu. E muita gente parece que chega: ao longo da estrada, tem muitas cruzes, mas muitas mesmo. Estrada perigosa, carros velhos e motoristas bolivianos não parece ser uma combinação lá muito boa.
Todas as vezes que o ônibus pára, seja para embarcarem passageiros ou pagar pedágio, dezenas de mulheres correm - correm literalmente - para vender comida. E vendem de tudo que se possa imaginar, sempre, claro, gritando sem parar, ao mesmo tempo e desesperadamente. Reparei que o choclo é um preferido por aqui.
Paramos para o almoço no lugar mais imundo que eu já vi na minha vida. E fedido - e olha que aqui eu já vi muita sujeira, viu? Desci mais para esticar as pernas mesmo. Não tinha nada industrializado, no pacotinho fechado e não tive coragem de pedir nada. Fiquei meio decepcionado comigo mesmo. Entrei de novo no ônibus e a senhorinha tirou duas maçãs da bolsa. Na hora eu pensei: "meu Deus, como iria bem uma frutinha agora". E então ela me ofereceu uma! Eu fiquei tão feliz que até exagerei no agradecimento:
- Muchisimas gracias, señora. Díos la bendiga!
Todos de barriga cheia, saímos e o motorista colocou na TV, então, um filme mexicano sobre um padre. Chato. Dormi.
Na beira da estrada, passamos por várias vilas e fiquei triste com o que vi. Umas casinhas que fariam qualquer barraco de favela brasileira parecer um palácio. Nunca vi tanta pobreza na minha vida. Miséria absoluta mesmo.
Chegando em La Paz, o episódio mais engraçado até agora - mas que bem poderia ter sido triste. O ônibus vinha a milhào por hora, e, numa curva, apareceu um caminhão atravessado na pista, saindo de uma obra. Bela freada! E adivinhem? Nosso motorista desceu na hora, abriu a porta do caminhào, puxou o sujeito para fora e sentou-lhe a porrada! Dois belos diretos de direita. Ficamos parados, todos os passageiros na janela xingando o pobre - inclusive minha amiga vovozinha -, até que chegou a polícia. E dá-lhe carajo e putamierda!
Chegamos com chuva em la Paz e eu já pulei dentro de um táxi. O trânsito estava uma mierda, com o perdão da palavra. Devia estar acontecendo alguma coisa no centro, porque várias ruas estavam fechadas e ouvia-se tiros de canhão e gritos do povo. Quem sabe um pronunciamento do presidente Evo e eu perdi?
O hostal que eu tinha escolhido - aleatoriamente - no guia não tinha quartos. Uma pena porque era muito bonito. Acabei ficando num outro perto. Meio moquifo, quando entrei me bateu até uma tristeza.
Saí para jantar na calle Sagárnaga, carinhosamente chamada pelos paceños de "alameda dos gringos". Entrei num café muito bonito e pedi o famoso mate de coca e um belo sanduíche para matar a fome acumulada da viagem. Decepção: o chá tem gosto de mato, nada diferente do chá verde. Tomei só de curiosidade mesmo, porque - fiquei muito feliz com isso - não senti efeito nenhum do soroche. Subi umas ladeiras enormes com a mochila - pesada em 15,4 kg no aeroporto - nas costas e nada. Estou inteirão!
Voltei para o hostal e ouvi gente falando inglês na cozinha. Corri para ver. Eram quatro americanas simpáticas. Uma delas morou um ano em Campinas e outra, meio coroa, dez anos na Argentina. Conversamos um pouco, trocamos figurinhas, eu fiz um chá de coca e fui deitar. E no cansaço que estava, o quarto nem me pareceu mais tão mal assim.
7.2.07
Cocha, para os íntimos
Já no avião, o piloto avisou: 40 graus em Cochabamba, e um céu de dar inveja a Curitiba. Claro que meu amigo niño berrou para comemorar. Descobri mais tarde que ela é conhecida por ciudad de la primavera eterna. Título justo.
Peguei o táxi no aeroporto e fui direto para um hostal que tinha escolhido no guia da Folha. A escolha foi aleatória, mas não poderia ter sido melhor. Quarto limpo e muito barato - o equivalente a uns 4 dólares. Aliás, tudo aqui é barato. Muito barato mesmo.
A cidade é... como explicar? Sabe aquelas partes do centro velho que voce nem gosta de passar porque é perigoso, com ruinhas estreitas e muita gente suspeita? Pois é. Agora coloquem mais um monte de carros, um monte mesmo, todos buzinando ao mesmo tempo e nenhum respeitando nenhuma lei de trânsito. Multiplique por cinco e isso é o centro de Cochabamba.
O povo é muito simpático - mais uma coisa de fazer inveja a Curitiba. É incrível como você olha para uma pessoa na rua e ela te sorri e cumprimenta. Nos locais em que entrei, todos fizeram o possível para entender meu espanhol. Fica aqui até uma dica: abre portas entrar num lugar e pedir na língua deles, pagar com dinheiro deles. Mesmo que você fale errado, as pessoas entendem e ficam felizes em ver seu esforço de ser como elas, e te tratam mil vezes melhor.
Mas, se por um lado, eles sao simpáticos, por outro são meio boca-suja. Bocas que minha mãe lavaria todas com sabão. O que se ouve de carajo, mierda e putamierda não está no gibi. Mas é só stress de trânsito. Que é, diga-se de passagem, simplesmente caótico. Primeiro que nunca eu vi tanta Pajero na vida - aliás, Montero, o nome é diferente porque pajero aqui é palavrão, não que isso fizesse muita diferença. Depois que os ônibus sao um capítulo à parte. São quase todos daqueles ônibus escolares americanos amarelos sucateados. Só que não são amarelos, são verdes, brancos, vermelhos, azuis e amarelos. Tudo junto, em padrões meio psicodélicos. Foram ótimas as lições que eu tomei com meu grande amigo De Niro, atravessar a rua aqui é sempre uma aventura. Eu me senti a própria Mulata Globeleza com um monte de carros buzinando para mim.
Voltando ao povo, eles são ótimos. É fácil ver que hay dos tipos de cochabambinos: os bolivianos, digamos, e o aymarás, descendentes de índios. As mulheres aymará sao facílimas de indentificar: usam umas saias que o pessoal da Máfia já conhece - piadinha interna -, chapéu coco no alto da cabeça e sempre carregam um tipo de um xale colorido nas costas. Dentro dos xales, que viram umas mochilinhas, vai de tudo, desde roupas e comida até crianças. Muito prático, só não comprei um para mim porque nao descobri como se amarra. Já os homens aymará são todos iguais ao presidente Evo. E o resto dos bolivianos são exatamente iguais aos brasileiros. Teve horas que me senti andando no centro de São Paulo. Até emo eu vi aqui!
Fora isso, em Cocha - já virei íntimo - não há muito o que ver. A plaza principal é muito bonita, mas uma volta já basta. Tinha um pessoal acampado lá, da reforma agrária, com ovelhas, galinhas e tudo, e eu não quis tirar muitas fotos para não atrair olhares furiosos e acabar virando refém de campesinos revoltados. Consegui entrar na catedral e me emocionei, é linda, "riquisima" como se diz aqui. Andando um pouco mais, chega-se a um parque, mas nada espetacular. Há outros lugares, como o Cristo da Concordia e o Monumiento a las heroinas, mas acabei não vendo nenhum dos dois. O dono do hostal me disse que es peligroso, ainda mais sozinho. Cara muito gente fina, aliás, me deu várias dicas de como sobreviver na Bolívia.
Nao senti efeito nenhum do soroche, o mal de altitude. Tirando que passei o dia inteiro sem nenhum apetite. Comi só um pão com zumo de naranja, meio empurrado. Bom, porque assim eu economizo um pouco. Aliás, comer aqui é complicado. Não encontrei nada parecido com a concepção de mercado que nos temos no Brasil. E sabe aqueles botecos imundos que sua mãe ensinou que não servem nem para tomar um copo de água? Pois é, 95% dos lugares aqui são assim. E olha que quem me conhece sabe que eu nao sou lá muito exigente com isso...
* * *
Acordei no meio da noite com trovões. Choveu pra dedéu. Quando dormi de novo, acordei com a campainha do hostal e alguém batendo na porta. Se bem que "batendo" é eufemismo meu, o cara quase trouxe o lugar abaixo. Olhei no relógio - meu celular só serve pra relógio - e eram cinco para as seis da manhã. O pessoal acorda cedo por aqui.
Tomei meu desayuno e me mandei para a rodoviária para ir para La Paz. Tempinho feio. Mas isso é o próximo capítulo.
Peguei o táxi no aeroporto e fui direto para um hostal que tinha escolhido no guia da Folha. A escolha foi aleatória, mas não poderia ter sido melhor. Quarto limpo e muito barato - o equivalente a uns 4 dólares. Aliás, tudo aqui é barato. Muito barato mesmo.
A cidade é... como explicar? Sabe aquelas partes do centro velho que voce nem gosta de passar porque é perigoso, com ruinhas estreitas e muita gente suspeita? Pois é. Agora coloquem mais um monte de carros, um monte mesmo, todos buzinando ao mesmo tempo e nenhum respeitando nenhuma lei de trânsito. Multiplique por cinco e isso é o centro de Cochabamba.
O povo é muito simpático - mais uma coisa de fazer inveja a Curitiba. É incrível como você olha para uma pessoa na rua e ela te sorri e cumprimenta. Nos locais em que entrei, todos fizeram o possível para entender meu espanhol. Fica aqui até uma dica: abre portas entrar num lugar e pedir na língua deles, pagar com dinheiro deles. Mesmo que você fale errado, as pessoas entendem e ficam felizes em ver seu esforço de ser como elas, e te tratam mil vezes melhor.
Mas, se por um lado, eles sao simpáticos, por outro são meio boca-suja. Bocas que minha mãe lavaria todas com sabão. O que se ouve de carajo, mierda e putamierda não está no gibi. Mas é só stress de trânsito. Que é, diga-se de passagem, simplesmente caótico. Primeiro que nunca eu vi tanta Pajero na vida - aliás, Montero, o nome é diferente porque pajero aqui é palavrão, não que isso fizesse muita diferença. Depois que os ônibus sao um capítulo à parte. São quase todos daqueles ônibus escolares americanos amarelos sucateados. Só que não são amarelos, são verdes, brancos, vermelhos, azuis e amarelos. Tudo junto, em padrões meio psicodélicos. Foram ótimas as lições que eu tomei com meu grande amigo De Niro, atravessar a rua aqui é sempre uma aventura. Eu me senti a própria Mulata Globeleza com um monte de carros buzinando para mim.
Voltando ao povo, eles são ótimos. É fácil ver que hay dos tipos de cochabambinos: os bolivianos, digamos, e o aymarás, descendentes de índios. As mulheres aymará sao facílimas de indentificar: usam umas saias que o pessoal da Máfia já conhece - piadinha interna -, chapéu coco no alto da cabeça e sempre carregam um tipo de um xale colorido nas costas. Dentro dos xales, que viram umas mochilinhas, vai de tudo, desde roupas e comida até crianças. Muito prático, só não comprei um para mim porque nao descobri como se amarra. Já os homens aymará são todos iguais ao presidente Evo. E o resto dos bolivianos são exatamente iguais aos brasileiros. Teve horas que me senti andando no centro de São Paulo. Até emo eu vi aqui!
Fora isso, em Cocha - já virei íntimo - não há muito o que ver. A plaza principal é muito bonita, mas uma volta já basta. Tinha um pessoal acampado lá, da reforma agrária, com ovelhas, galinhas e tudo, e eu não quis tirar muitas fotos para não atrair olhares furiosos e acabar virando refém de campesinos revoltados. Consegui entrar na catedral e me emocionei, é linda, "riquisima" como se diz aqui. Andando um pouco mais, chega-se a um parque, mas nada espetacular. Há outros lugares, como o Cristo da Concordia e o Monumiento a las heroinas, mas acabei não vendo nenhum dos dois. O dono do hostal me disse que es peligroso, ainda mais sozinho. Cara muito gente fina, aliás, me deu várias dicas de como sobreviver na Bolívia.
Nao senti efeito nenhum do soroche, o mal de altitude. Tirando que passei o dia inteiro sem nenhum apetite. Comi só um pão com zumo de naranja, meio empurrado. Bom, porque assim eu economizo um pouco. Aliás, comer aqui é complicado. Não encontrei nada parecido com a concepção de mercado que nos temos no Brasil. E sabe aqueles botecos imundos que sua mãe ensinou que não servem nem para tomar um copo de água? Pois é, 95% dos lugares aqui são assim. E olha que quem me conhece sabe que eu nao sou lá muito exigente com isso...
* * *
Acordei no meio da noite com trovões. Choveu pra dedéu. Quando dormi de novo, acordei com a campainha do hostal e alguém batendo na porta. Se bem que "batendo" é eufemismo meu, o cara quase trouxe o lugar abaixo. Olhei no relógio - meu celular só serve pra relógio - e eram cinco para as seis da manhã. O pessoal acorda cedo por aqui.
Tomei meu desayuno e me mandei para a rodoviária para ir para La Paz. Tempinho feio. Mas isso é o próximo capítulo.
6.2.07
E começa a aventura
A aventura começou para chegar ao aeroporto. Cheguei no Terminal da Barra Funda para pegar um ônibus especial que vai para Guarulhos. Isso eram 6:50 da manha. E o ônibus saía às 6:55!
Eu nao sabia nem onde pegar o tal, mas ainda consegui a tempo comprar a passagem e embarcar.
Chovia forte desde a madrugada - um tempinho ótimo para eu ter ficado debaixo das cobertas - mas lá estava eu, saindo rumo à maior aventura da minha vida. No rádio do ônibus, tocava Here comes the sun, dos Beatles. Um bom sinal.
* * *
Peguei o vôo para Assunción, no Paraguai, onde faria conexão para Cochabamba. Um pessoal resolveu se estressar quando o avião demorou, mas eu mantive a calma, mesmo quando um boliviano veio e me perguntou um monte de coisas ao mesmo tempo, finalizando com carajo no final. Eles nao têm muita paciência para as coisas, mas são muito boa gente. Virei hermano já.
No avião, veio um niño gritando e chorando o tempo todo. "Jugando", como disse a mãe dele. E adivinhem do lado de quem? Pois é. Consegui dormir uns dez minutos só quando o pestinha resolveu fazer a siesta dele também.
Mas foi tudo certo, consegui fazer a conexão sem problemas, apesar do atraso. E quando procurei meu assento no avião para Cochabamba, adivinhem quem estava bem do meu lado, já gritando a plenos pulmões? Certas coisas só acontecem comigo...
Eu nao sabia nem onde pegar o tal, mas ainda consegui a tempo comprar a passagem e embarcar.
Chovia forte desde a madrugada - um tempinho ótimo para eu ter ficado debaixo das cobertas - mas lá estava eu, saindo rumo à maior aventura da minha vida. No rádio do ônibus, tocava Here comes the sun, dos Beatles. Um bom sinal.
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Peguei o vôo para Assunción, no Paraguai, onde faria conexão para Cochabamba. Um pessoal resolveu se estressar quando o avião demorou, mas eu mantive a calma, mesmo quando um boliviano veio e me perguntou um monte de coisas ao mesmo tempo, finalizando com carajo no final. Eles nao têm muita paciência para as coisas, mas são muito boa gente. Virei hermano já.
No avião, veio um niño gritando e chorando o tempo todo. "Jugando", como disse a mãe dele. E adivinhem do lado de quem? Pois é. Consegui dormir uns dez minutos só quando o pestinha resolveu fazer a siesta dele também.
Mas foi tudo certo, consegui fazer a conexão sem problemas, apesar do atraso. E quando procurei meu assento no avião para Cochabamba, adivinhem quem estava bem do meu lado, já gritando a plenos pulmões? Certas coisas só acontecem comigo...
2.2.07
Diário de viagem - prefácio
De hoje em diante, o Acepipes vai ser um blog convencional. Vou usar o espaço gentilmente cedido pelo Google - eles ainda dominarão o mundo! - para contar que horas acordei, o que comi e coisa e tal. Quem sabe até fotos!
Mas calma, eu explico. Estou saindo de férias hoje. Mas nada de ficar o dia inteiro de pijama morcegando em casa. Desta vez eu resolvi encarar uma aventura. Uma aventura de verdade. Na próxima terça-feira, eu me empirulito para os Andes, lá em cima, e fico por lá até dia 26.
O plano é simples: desembarco em Cochabamba, na Bolívia, e vou viajando até Machu Picchu, no Peru. Agora como se faz isso eu vou descobrir na hora. O pessoal achou meio loucura quando soube que eu vou sozinho, mas, cá entre nós, para mim esta parece ser a parte mais legal da história toda.
Vou comer empanadas, beber chá de coca, ver as lhamas, descansar no lago Titicaca, andar em ônibus cheio de galinhas, rezar para Nuestra Señora de Copacabana, falar portunhol - o meu é fluentíssimo - e ouvir discurso do Evo Morales. Quem sabe até encontre uns pedaços meus que eu andei perdendo aí pelo ano passado.
Enfim, meu blog vai virar um diário de viagem durante este tempo. Afinal de contas, mamãe precisa de notícias. E para quem acha loucura, esperem só até eu voltar com as fotos. Vocês vão babar de inveja!
Prometo trazer um CD especial com as mais belas canções de flauta boliviana a todos que comentarem aqui.
* * *
p.s. Se for baratinho, eu compro umas lhamas e fico por lá. Eu sempre quis ter uma lhama.
Mas calma, eu explico. Estou saindo de férias hoje. Mas nada de ficar o dia inteiro de pijama morcegando em casa. Desta vez eu resolvi encarar uma aventura. Uma aventura de verdade. Na próxima terça-feira, eu me empirulito para os Andes, lá em cima, e fico por lá até dia 26.
O plano é simples: desembarco em Cochabamba, na Bolívia, e vou viajando até Machu Picchu, no Peru. Agora como se faz isso eu vou descobrir na hora. O pessoal achou meio loucura quando soube que eu vou sozinho, mas, cá entre nós, para mim esta parece ser a parte mais legal da história toda.
Vou comer empanadas, beber chá de coca, ver as lhamas, descansar no lago Titicaca, andar em ônibus cheio de galinhas, rezar para Nuestra Señora de Copacabana, falar portunhol - o meu é fluentíssimo - e ouvir discurso do Evo Morales. Quem sabe até encontre uns pedaços meus que eu andei perdendo aí pelo ano passado.
Enfim, meu blog vai virar um diário de viagem durante este tempo. Afinal de contas, mamãe precisa de notícias. E para quem acha loucura, esperem só até eu voltar com as fotos. Vocês vão babar de inveja!
Prometo trazer um CD especial com as mais belas canções de flauta boliviana a todos que comentarem aqui.
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p.s. Se for baratinho, eu compro umas lhamas e fico por lá. Eu sempre quis ter uma lhama.
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