8.12.09

Tarot

Série especial de aniversário
(publicado originalmente em 8.5.2008)

Há meses eu tento escrever uma história de suspense com cartas de tarot. O Calvino escreveu um livro só com isso e ficou genial; eu nem tenho tanta pretensão, só queria uma história curtinha mesmo. Mas deparo-me sempre com dois problemas: nem eu acredito muito e nem eu entendo nada de tarot. Nadinha. O negócio é que acho as cartas muito charmosas, vejo nelas uma possibilidade literária muito grande. Sem contar que aumentaria minha popularidade escrever sobre coisas assim esotéricas —vejam só o Paulo Coelho.
     Pensei talvez numa coisa assim: uma mulher de roupão de seda cai do décimo terceiro andar de um hotel no centro da cidade. Aquela comoção, os populares fazem roda para olhar, os bombeiros e o socorro chegam tarde demais, o IML é chamado. Então um rapaz repara que ela segura uma carta na mão esquerda. Num gesto meio impensado, ele pega a carta e esconde debaixo das blusas. Não sabe por quê fez isso, mas sentiu que devia, as teias invisíveis do destino o moveram. Sai andando apressado, as mãos suando de nervosismo. Dobra a primeira esquina, entra, ofegante, numa cabine telefônica e olha para a carta que tem escondida sob a jaqueta: é a rainha de copas.
     Ou assim: um sujeito entra num pub. O lugar é meio escuro, quase vazio, o neon atrás do balcão pisca de tempos em tempos, no fundo toca um blues. Num dos cantos, um cara meio estranho, encapuzado, dispõe um baralho na mesa. Nosso sujeito senta no balcão e pede um uísque duplo, cowboy. Passou por um dia muito difícil, precisa de um bom trago para pensar na vida, nas teias invisíveis do destino. O barman erra no pedido e serve rum com duas pedras de gelo. Porém, quando nosso amigo levanta os olhos para reclamar, vê que o barman sumiu. Então o homem do capuz vem na sua direção e lhe entrega uma carta: é o enforcado.
     Ou então: um contador solteirão resolve comemorar a aposentadoria com uma viagem no Expresso do Oriente. Numa noite, enquanto toma uma sopa no vagão restaurante, ele é abordado por um sujeito visivelmente transtornado que fala algo sobre as teias invisíveis do destino, entrega-lhe um envelope e sai, apressado. Em seguida, passa por ali um russo albino enorme, mais parece um urso polar, com uma cicatriz que vai de fora a fora no rosto, e toma o mesmo rumo. Ouve-se um estampido lá fora. Nenhum dos dois aparece de volta. Mais tarde, na sua cabine, o contador abre o envelope: dentro há uma carta de tarot, o arcano do usurpador.
     E aí é que entram mais problemas: não sei como terminar nenhuma das possibilidades, suspeito que minha interpretação das cartas esteja errada e acho que nem deve existir um arcano —se é que é mesmo essa a palavra, "arcano"— do usurpador.
     Melhor deixar para lá, viu?

* * *
Esse post ganhou uma releitura –muito melhor que meu texto original– que foi publicada pela Stephanie no blog dela.

5 comentários:

Lua Durand disse...

bom inicio para um texto com tarot... daria bons textos, suspense, as três histórias começadas. daria até um livro, um filme, quem sabe!

"vejam só o Paulo Coelho." hahahaha

=)

Stephanie disse...

esse texto também é um dos meus preferidos! e eu me diverti muito escrevendo essa releitura =)

valeu pela propaganda, Bruno
beijos!

Julia disse...

Caramba, eu li os dois textos na época.. *_*
Muito bons!
Legal tbm ver quanto tempo eu acompanho seu blog.
Parabéns pelo espaço, seus textos são muito bem escritos, inteligentes e divertidos: adooooro!

Beeijooo

Cissa disse...

poxa, eu gostei das possibilidades, mesmo que não tenham a ver com as cartas de verdade. mas só pela imaginação mesmo. também não entendo nada de tarot. =P
rsrs..
beijo.

Elga Arantes disse...

No final das contas, o importante é que
seja algo que fale "sobre as teias invisíveis do destino", não é? rsrsrs...